A Região Autónoma da Madeira, com sua rica herança cultural e musical, enfrenta um dilema significativo no que diz respeito à valorização e promoção de sua diversidade artística. Embora a música popular continue a ser uma presença constante nos grandes eventos, os artistas de qualidade comprovada, que se dedicam a géneros como a música tradicional madeirense, música erudita, jazz, rock, alternativa e outros, sentem-se injustiçados.
A música popular, caracterizada por letras simples e ritmos contagiantes, desempenha um papel crucial nos eventos sociais e culturais da Madeira. Ela é frequentemente associada a celebrações, festas e romarias, proporcionando um meio de união e alegria para a população. Contudo, a predominância deste estilo musical nos vários eventos levanta questões sobre a diversidade cultural e a inclusão de outros géneros musicais de igual ou maior valor artístico.
A preferência pela música popular pode levar a uma homogeneização cultural, onde outras formas de expressão artística são negligenciadas. Artistas que se dedicam a géneros musicais mais complexos e que requerem maior apreciação técnica e intelectual, muitas vezes encontram dificuldades em obter visibilidade e reconhecimento. Isso não apenas desmotiva esses artistas, mas também empobrece a oferta cultural disponível para a população.
Para entender melhor esta dinâmica, é importante considerar vários fatores, incluindo a educação musical, a influência dos meios de comunicação, as práticas dos promotores culturais e as expectativas do público. A educação musical formal, ou a falta dela, desempenha um papel significativo na forma como diferentes tipos de música são percebidos e apreciados. Além disso, os meios de comunicação tendem a promover conteúdos que atraem maiores audiências, muitas vezes em detrimento de produções mais sofisticadas e menos comerciais.
Artistas populares tendem a valorizar-se mais do que outros artistas que apresentam uma qualidade musical e lírica superior. Os promotores culturais, no entanto, estão dispostos a pagar os valores e condições exigidas, ao invés de terem mais grupos de qualidade a preços e exigências mais acessíveis, em detrimento de um maior número de pessoas no evento. Isso cria um ciclo onde a música popular, apesar de ser mais cara, continua a dominar devido à sua capacidade de atrair grandes públicos, mesmo que isso signifique uma menor diversidade de oferta musical.
Além disso, há a questão dos eventos populares, como festas e arraiais, que celebram a gastronomia local com temas variados como gaiado, atum, peixe-espada, castanha, cebola, arte e pesca, sopas, limão, anona, marisco, lapa e outros. Estes eventos reúnem a maioria dos concertos e atuações ao longo do ano, com livre acesso ao público. Quando um artista decide realizar um concerto numa sala fechada e cobrar bilhete, enfrenta uma grande dificuldade em encher a sala, pois a população está acostumada a ver os mesmos artistas ao ar livre em eventos de caráter popular.
Para promover a diversidade cultural, uma das medidas concretas é a educação musical e a sensibilização. É essencial integrar nos programas de educação musical a exposição aos alunos a uma variedade de géneros musicais, incluindo música erudita, jazz, rock, música tradicional madeirense e outros. Além disso, a organização de workshops e palestras com músicos locais e internacionais pode discutir a importância da diversidade musical e oferecer formação em diferentes estilos.
Apoiar os artistas locais também é crucial. Porque não se criam programas de financiamento e subsídios específicos para artistas que trabalham com géneros musicais menos comerciais? Assim, podia-se garantir que tivessem os recursos necessários para desenvolver e apresentar suas obras. E se, politicamente falando, não se achar que o apoio financeiro é a melhor medida, poder-se-á sempre organizar festivais que celebrem a diversidade musical, dando espaço e visibilidade a músicos de diferentes géneros, é outra medida importante.
Os meios de comunicação também têm um papel vital a desempenhar. É necessário incentivar rádios, televisões e plataformas online a incluir uma programação musical diversificada que vá além do popular e do comercial. Os músicos locais podem ser convidados para a criação de conteúdo exclusivo que destaque a variedade e a riqueza da música feita na Madeira.
Os promotores culturais devem adotar critérios de seleção que valorizem tanto a popularidade quanto a qualidade artística, garantindo um equilíbrio nos eventos. Devem também criar mecanismos de feedback e consultoria que envolvam a comunidade artística na tomada de decisões sobre os eventos culturais, podendo assim melhorar a representatividade e a qualidade das apresentações.
As iniciativas governamentais também são fundamentais para promover a diversidade cultural no sentido da implementação de políticas culturais que promovam a diversidade e a inclusão, reconhecendo a importância de todos os géneros musicais no desenvolvimento cultural da região. Isto é essencial! O governo porque não promove incentivos fiscais para as empresas e organizações que apoiam eventos culturais diversificados? Isto podia estimular um ambiente mais favorável à diversidade artística.
Além disso, é crucial abordar a questão do acesso ao público. A existência de campanhas de sensibilização que incentivem o público a participar de eventos pagos e a valorização da experiência de assistir a concertos em salas fechadas pode ajudar a mudar a mentalidade atual. Podem-se oferecer descontos ou pacotes promocionais para incentivar a compra de bilhetes para atrair mais público para esses eventos. E porque não ter eventos populares, de entrada paga, cujas receitas revertam em parte para os artistas participantes? No continente existem já há vários anos eventos culturais (por exemplo feiras medievais) cuja entrada é paga. Porque não experimentar essa medida na região?
A valorização da cultura na Região Autónoma da Madeira requer um esforço conjunto de todos os setores da sociedade. Desde a educação musical até a promoção de eventos diversificados, passando pelo apoio direto aos artistas, há muito que pode ser feito para garantir que a riqueza cultural da Madeira seja plenamente apreciada e valorizada. Ao adotar uma abordagem mais inclusiva e equilibrada, podemos garantir que todos os artistas, independentemente do género musical, tenham a oportunidade de brilhar e contribuir para um panorama cultural vibrante e diversificado. Isto não só iria desenvolver o cultivo pela arte e cultura na Madeira e Porto Santo, como também iria educar públicos, agentes e dirigentes para a valorização cultural, colocando a cultura a trabalhar para a cultura, com mais ou menos entretenimento, mas sempre dentro de uma lógica de valorização justa de cada conteúdo.
A RAM oferece Natureza: nós damos o melhor que temos e somos referência. A RAM oferece gastronomia: mais uma vez, somos excelentes a oferecer as melhores iguarias aos visitantes. Agora… a RAM quando oferece cultura, sabe vendê-la da melhor forma? Por algum acaso nenhum turista entende de música, boa música, dança, teatro, canto, artes plásticas, património e outros?
Desenganem-se!
Enviado por Denúncia Anónima
Domingo, 21 de julho de 2024
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