Barulho: o som inconfundível do subdesenvolvimento.


Ex.mos Senhores do Grupo Pestana,

Q uero começar por agradecer, do fundo do coração, o vosso contributo incansável para a reinvenção do conceito de espaço público. É realmente inspirador ver como transformaram a zona da Praia Formosa numa espécie de resort privado à força, onde o asfalto se estende magicamente — sem licenças, sem avisos, sem um pingo de vergonha — como se o mundo fosse vosso e os residentes figurantes.

É reconfortante viver num sítio onde acordamos com o som das gaivotas, o mar, e agora — cereja no topo do betão — música de animação logo pela manhã, para “alegrar os turistas”. Uma verdadeira experiência sensorial! Porque não há nada como fazer uma caminhada matinal ao som de um DJ de hotel aos gritos com microfone enquanto se tenta ignorar a máquina de alcatrão que está a comer mais um pedaço da costa. Os moradores? Ah, esses que se lixem, não é? Quem mandou viverem perto de um império?

Já agora, uma salva de palmas para a Câmara Municipal do Funchal, cuja invisibilidade é digna de truque de ilusionismo de Las Vegas. Assistem impávidos enquanto o Hotel Pestana decide que pode estender o estacionamento até à areia, ocupar terrenos públicos como quem estende uma toalha de praia, e ainda ser premiado como bom exemplo de investimento. Imagino que o critério seja: quanto mais ilegalidades, mais convites para jantares de gala.

Entendo agora o novo conceito turístico da Madeira: chama-se “Experiência Colonial 2.0” — onde o hóspede tem tudo, o empresário tem mais ainda, e os moradores têm… ruído, obras e o privilégio de assistir ao espetáculo em primeira fila, sem direito a intervenção.

Mas pronto, viva a economia, não é? Viva o progresso, o crescimento, e acima de tudo, viva a capacidade de fazer o que se quer, onde se quer, desde que se tenha um logo bonito, uma bandeira com sol e uma relação calorosa com quem decide.

Fico na expectativa de que um dia possa estacionar o meu carro no jardim da Presidência do Governo e montar um altifalante a tocar Bailando às 9h da manhã, só para ver se também me oferecem um subsídio. Vão embora Miguel Albuquerque e Pedro Calado desta ilha. Já ninguém vos aguenta. Desapareçam do mapa, por favor.

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