E m São Vicente, um município modesto da Madeira, ocorreu algo que já se temia, mas que poucos queriam verdadeiramente admitir: o fascismo, em sua forma mais descarada e revanchista, ressurgiu com força nas urnas. A vitória do partido CHEGA nas eleições autárquicas de 2025 em São Vicente não é apenas um reflexo de uma escolha política, mas um retrato sombrio da realidade social e política de uma parte da população portuguesa que, ao que tudo indica, preferiu fechar os olhos ao futuro.
A ascensão de partidos como o CHEGA no contexto atual não é algo que deva ser visto como uma novidade. A ideologia fascista não surgiu ontem, e muito menos em São Vicente. Ela estava escondida, camuflada, entre as brechas do medo e do conservadorismo, nas palavras vazias e nas promessas populistas de muitos dos que compõem o espectro político tradicional. Durante anos, esses mesmos fascistas navegaram pelas águas turvas do Partido Social Democrata (PPD/PSD), mas agora decidiram se revelar, sem receio, no campo aberto de um partido que, para muitos, é sinônimo de retrocesso.
A verdade que ninguém queria admitir é que São Vicente, mais do que qualquer outro lugar, sempre teve uma relação peculiar com a política nacional. Uma terra de emigrantes, onde o paradoxo de ser uma população que emigra mas que, ao mesmo tempo, adota atitudes anti-imigrantes, revela uma contradição que beira o absurdo. A vitória do CHEGA aqui não foi um erro de cálculo, mas o produto de uma escolha consciente, impulsionada por um discurso carregado de ódio, xenofobia e, mais ainda, um desprezo claro pelos valores da democracia.
A democracia, aliás, foi alvo de um verdadeiro ataque nas urnas. A vitória do CHEGA em São Vicente é um verdadeiro atentado à Revolução de Abril de 1974, um desrespeito aos princípios de liberdade, igualdade e fraternidade que tão arduamente conquistamos. Para os defensores do regime democrático, para aqueles que acreditam na dignidade humana e na convivência pacífica entre as diferentes etnias, culturas e crenças, este resultado é uma vergonha, uma mancha na história da cidade.
Com um discurso populista, baseado em promessas vazias e soluções fáceis, os candidatos do CHEGA conseguiram cativar a população desiludida, aquela que, na busca por um líder forte, está disposta a fechar os olhos para os perigos que o fascismo impõe. E é nesse vácuo, nesse campo de ignorância e raiva, que os fascistas plantam suas sementes de desinformação e medo.
São Vicente agora é uma cidade que se encontra à mercê de uma política retrógrada, onde o medo do outro, o ódio aos imigrantes e a discriminação contra as minorias serão, possivelmente, as bandeiras da nova administração. O que nos espera nos próximos quatro anos? Um retrocesso sem igual, onde as promessas do CHEGA serão diluídas em um mar de retórica vazia, onde o foco estará mais em criar inimigos do que em resolver os reais problemas da população.
O povo de São Vicente, infelizmente, não parece ter entendido a gravidade da situação. Ao celebrar a vitória de um partido que, claramente, se alinha com ideologias fascistas, muitos parecem ter perdido o bom senso, a razão e, mais importante, a memória histórica. O provérbio que diz "São Vicente São Burros, mas não são Gente" agora parece mais atual do que nunca, uma crítica amarga, mas verdadeira, ao estado de letargia e ignorância política que parece dominar muitos dos vicentinos.
Não se trata apenas de uma escolha política, mas de uma escolha existencial. Ao eleger o CHEGA, os vicentinos não apenas escolheram um partido, mas abraçaram uma ideologia que, se não for desmantelada rapidamente, poderá levar a cidade a um caminho sem retorno. Em um momento como este, em que as ideias mais radicais ganham terreno, é crucial que os cidadãos de São Vicente se perguntem: "O que realmente estamos a apoiar? Que futuro queremos para os nossos filhos e netos?"
A ascensão do CHEGA em São Vicente deve servir como um alerta não apenas para a Madeira, mas para toda a sociedade portuguesa. O país, que se orgulha de ser um modelo de liberdade e democracia, não pode permitir que se faça o jogo de uma ideologia que rejeita tudo o que foi conquistado com tanto esforço e sangue. São Vicente, infelizmente, parece ter sido a primeira vítima, mas poderá não ser a última.
O fascismo, quando se disfarça de populismo, tem uma capacidade única de se infiltrar nas mentes das pessoas. Promete o impossível, alimenta os medos mais primitivos e cria uma falsa sensação de segurança. Mas é uma segurança construída sobre o medo do outro, sobre a intolerância e, acima de tudo, sobre a negação da humanidade do próximo. E, nesse jogo, todos saem perdendo. O povo de São Vicente, ao apoiar o CHEGA, pode ter caído na armadilha da retórica vazia e manipulatória de um partido que, no fundo, pouco se importa com o bem-estar da população. Eles querem poder, querem privilégios, querem manter o status quo da opressão e da exclusão.
Por mais que os apoiantes do CHEGA digam que a sua vitória é uma vitória "do povo", a verdade é que essa vitória tem um preço muito alto. Um preço que, quando for pago, poderá ser irreversível. A luta pela democracia, pela justiça social e pela igualdade nunca foi fácil, mas foi uma luta que, ao longo de décadas, nos trouxe a uma sociedade mais justa e inclusiva. Agora, em São Vicente, estamos a ver o retrocesso dessa luta, e é nossa responsabilidade, como cidadãos conscientes, lutar para que o fascismo não ganhe terreno.
São Vicente, infelizmente, está prestes a entrar em um ciclo de regressão. Mas a história tem mostrado que, quando o povo se levanta contra a tirania, há sempre uma possibilidade de mudança. Resta saber se a cidade de São Vicente, com todo o seu orgulho e tradição, será capaz de perceber o erro cometido e corrigir o seu rumo antes que seja tarde demais.
Não há dúvida: os próximos quatro anos serão cruciais para o futuro de São Vicente. E, com a ascensão do CHEGA, a pergunta que se impõe é: que cidade queremos construir? A resposta depende de todos nós.