O eco do Chega em São Vicente


Uma reflexão crítica sobre as Eleições Autárquicas de 2025

A democracia em São Vicente recebeu uma inesperada e, para muitos, uma desoladora confirmação: o partido CHEGA venceu de forma expressiva as eleições autárquicas, arrebatando não só a Câmara Municipal, mas também a Assembleia Municipal e a Assembleia de Freguesia. A vitória do CHEGA, com 49,23% dos votos na Câmara Municipal, 47,13% na Assembleia Municipal e 48,48% na Assembleia de Freguesia, marca um novo ponto de viragem na política local, uma vitória que, pela sua natureza e origem, merece ser analisada com olhos críticos e conscientes, sobretudo pela forma vulgar e desonesta como a campanha do partido foi conduzida.

Em primeiro lugar, é impossível deixar de reconhecer a vontade popular expressa nas urnas. A democracia, por mais incómoda que possa ser em alguns momentos, é o pilar que sustenta a nossa liberdade. E, por isso, respeitamos o resultado, felicitamos o candidato José Carlos Gonçalves e a sua equipa pela conquista, mas a honestidade intelectual e política exige-nos um exame profundo e reflexivo do que aconteceu, do que isso significa para a nossa sociedade e, sobretudo, do que isso representa para o futuro político de São Vicente.

A campanha: desprezo pela ética e pela verdade

A campanha do CHEGA foi, sem dúvida, um desfile de ataques baixos, discursos de ódio e uma tentativa descarada de dividir a população com narrativas falsas e destrutivas. Não houve propostas concretas, projetos para o futuro ou sequer ideias claras sobre como melhorar a vida dos vicentinos. O que vimos foi uma enxurrada de mentiras, uma lavagem de roupa suja em praça pública e um apelo direto aos instintos mais baixos da população: o medo, o ressentimento e a raiva.

A política deve ser o espaço da razão, do debate construtivo e da procura de soluções. O que o CHEGA fez em São Vicente foi exactamente o contrário: transformou a política local num terreno pantanoso, onde as verdades foram deturpadas, os adversários políticos vilipendiados e a honra, o respeito e a ética foram deixados à porta. Isto é algo que não podemos, em circunstância alguma, aceitar como um preço a pagar pela democracia.

A ideologia por trás do CHEGA: uma ameaça silenciosa à liberdade

O CHEGA é um partido que se identifica com uma ideologia de extrema-direita, cujas raízes estão profundamente ancoradas no salazarismo e num nacionalismo radical que faz acenos ao passado autoritário do Estado Novo. Ao olhar para a composição do partido e para a sua retórica, é impossível não perceber que a vitória do CHEGA em São Vicente é, na prática, um ressurgimento de ideais fascistas que pertencem a uma época negra da história de Portugal.

É importante não cairmos na tentação de banalizar o discurso deste partido. Quando se fala em "anti-sistema", "anti-emigrante" e "anti-liberdade", não estamos perante um movimento político legítimo, mas perante uma tentativa clara de desestabilizar a nossa ordem democrática. O CHEGA não apresenta soluções; apresentam ressentimentos, não apresentam políticas; apresentam divisões.

José Carlos Gonçalves, o candidato vitorioso, é um exemplo claro de um "salta-poças" da política, um indivíduo cuja única constante tem sido mudar de partido à medida que o vento político sopra em busca de poder. Isto não é política, isto é oportunismo. O que mais me assusta não é a vitória em si, mas a normalização da extrema-direita, o fortalecimento de um discurso que promove a exclusão, o ódio e a intolerância. O CHEGA, enquanto partido de Salazar, não representa o futuro de São Vicente, mas antes um perigoso retrocesso para o passado.

A democracia em risco: o impacto de uma vitória chegada ao poder

Quando observamos a ascensão de partidos como o CHEGA, é impossível não perceber que estamos a enfrentar um fenómeno global: a ascensão da extrema-direita e a erosão gradual das democracias liberais em várias partes do mundo. A democracia, no seu cerne, é uma busca constante pelo compromisso, pela liberdade de expressão e pelo respeito pelas diferenças. No entanto, a estratégia populista e polarizadora do CHEGA destrói estes valores fundamentais, substituindo-os por um discurso simplista e divisivo.

O que está aqui em causa não são apenas as eleições autárquicas, mas o próprio futuro político de São Vicente e de Portugal. A ascensão de um partido como o CHEGA não é uma vitória da democracia, é uma derrota para a razão, para a justiça social e para os valores que a Revolução de Abril de 1974 nos deu. A vitória do CHEGA, por isso, deve ser vista como um aviso para todos aqueles que ainda acreditam que a nossa democracia está imune a ataques externos e internos.

O papel dos vicentinos: o futuro de São Vicente em jogo

O que me surpreende, e ao mesmo tempo me entristece, é o facto de os vicentinos, com uma longa tradição de luta e resistência, poderem ter optado por este caminho. São Vicente não é terra de fascistas, de racistas ou de intolerantes. Somos um povo que tem na sua história a luta pela liberdade, pela igualdade e pela fraternidade. Por isso, ao optarmos por votar num partido que despreza estes valores, estamos a trair a nossa própria identidade.

Eu, pessoalmente, não me calarei perante esta ameaça. A minha missão é clara: a luta pela liberdade, pela democracia e pelos valores que defendem a nossa sociedade. A vitória do CHEGA não será uma vitória final, e aqueles que hoje celebram a sua ascensão devem saber que ainda há muito pela frente. A democracia é uma luta constante, e, como dizia o grande filósofo Karl Popper, "a tolerância deve ter limites, caso contrário a intolerância destruirá a própria tolerância".

Conclusão: a luta continua

Por isso, a partir de hoje, o meu ultimato está dado: não descansarei enquanto não vir o CHEGA fora de São Vicente. Não podemos permitir que a nossa terra seja marcada por um partido que defende a opressão, o autoritarismo e a divisão. Este é um apelo à ação, um apelo a todos aqueles que acreditam que a liberdade e a justiça devem prevalecer. A democracia não se constrói numa vitória de retórica vazia e de falsas promessas, mas na construção constante de uma sociedade mais justa, inclusiva e equitativa.

Viva a Liberdade! Viva a Democracia! Viva a Revolução de Abril! E que o fascismo nunca mais tenha lugar em São Vicente.