T endo lido o recente - e pertinente artigo - saído no Correio da Madeira, gostaria de contribuir com mais algumas notas que possibilitem uma análise mais compreensiva (e, necessariamente, subjectiva) no que respeita à importante temática do ensino (regional).
1. A distinção entre ensino público, privado e cooperativo advém da própria Constituição da República portuguesa, salvo erro desde a sua versão inicial de 1976.
1.1 Afinal e como nota histórica, era importante salvaguardar o facto de que a família do 'socialista de caviar' - e actual defunto - Mário Soares, ser dona do conhecido Colégio Moderno...
1.2. O Ensino religioso foi resultado da ampla liberdade à actividade religiosa negociada nos termos de uma Concordata (o equivalente a um Tratado Internacional) celebrada entre o (Estado do) Vaticano e o Estado português.
1.3. Daí que não seja rigorosa uma mera distinção entre ensino público e ensino privado. É redutora e induz em erro. Há em Portugal (na Madeira e nos Açores, cujo Estatuto Político não substitui a Constituição, como muitos por vezes se esquecem) 4 formas de intervir no ensino, no que toca à oferta dos respectivos serviços.
1.4. Seja por interesses ocultos seja ao abrigo do importante princípio da Liberdade de Ensino, aos Pais e Encarregados de Educação era dada a oportunidade de optar pelo ensino público, ou pelo particular ou pelo cooperativo. Opção esta que não existe em Estados totalitários (nomeadamente comunistas, mas neste caso os dirigentes do PC, ao mesmo tempo que cantavam a 'Internacional', mandavam os seus filhos para os colégios privados do estrangeiro; a começar por Trotsky nos Estados Unidos, onde teve 'formação' de alguns capitalistas para implementar a revolução russa de 1917).
2. Há depois uma propositada confusão de conceitos, designadamente, entre Educação e Instrução.
2.1. A Educação recebe-se em casa (na gíria popular, "vem do berço");
2.2. A Instrução recebe-se na Escola. Não era por acaso que havia um Ministério da Instrução Pública.
3. Derivado da (des)evolução das sociedades ocidentais e da degradação das condições de vida das populações, o certo é que a Família, pilar de qualquer sociedade saudável, foi sofrendo sucessivos ataques, a partir do momento em que os dois adultos de um mesmo agregado familiar foram forçados a entrar no mercado de trabalho, pois que o rendimento de um passou a ser insuficiente o sustento da prol.
3.1. Toda a organização interna em termos de organização familiar interna foi sofrendo alterações, com grande impacto na educação dos filhos. Nuns casos, os avós passaram a ter uma intervenção mais activa e noutros casos, em que tal acompanhamento não era possível, as famílias viram-se obrigadas a 'tranferir' essa responsabilidade para os professores e directores (de escola e de turma).
3.1.1. Com tantas experiências, não se percebe (ou talvez se perceba) que, em face do excesso de professores com "horário zero", não tivesse sido (nem que fosse informalmente) instituída a figura do "tutor", a quem fosse atribuído um número de alunos a acompanhar, em especial fora do contexto da sala de aula e de fazer a ligação directa entre a escola (professores das disciplinas) e os pais, que lhe delegariam, em contexto escolar, a autoridade educativa.
3.2. Depois, fruto da sucessiva degradação dos princípios e valores morais judaico-cristãos, de um sucessivo 'geracional-facilitismo', em detrimento do esforço e compromisso e de uma cultura 'progressista' que apenas olha para os direitos e esquece os deveres, passou a ser entendido que essa transferência de responsabilidades educativas seria uma 'obrigação própria'... dos professores!
3.3. Esta situação sempre teve a cumplicidade do poder político e oligárquico (com precisas 'instruções globalistas', documentadas em livro, para a degradação do ensino - incluindo condições de trabalho e salariais dos professores e pessoal auxiliar - e a estupidificação do mesmo em termos de conteúdos a leccionar), na 'linha calado', ou seja, daquilo que todos sabemos: "quanto pior melhor".
4. A situação na Madeira, com a instauração da Autonomia teve 3 fases relativamente distintas, mas com um traço-comum:
4.1. Fruto do fervoroso apoio dos Bispos (Francisco Santana e Teodoro) a Alberto João Jardim, a Igreja Católica foi acumulando sucessivamente uma situação cada vez mais preponderante e a roçar, até, a 'concorrência desleal' face aos 3 tipos de ensino atrás elencados.
4.2. Ao mesmo tempo que (e bem) foi criada uma rede pública escolar pela ilha, em paralelo à construção de centros de saúde (ainda que o preço da construção civil fosse 3 vezes superior ao preço de mercado), o objectivo oculto era o de ter 'comissários políticos' em detrimento do princípio da democraticidade da gestão. Tanto que é possível verificar quantos directores de escolas, em resultado desses 'bons serviços', passaram pelo parlamento regional ou por outros cargos com relativo destaque.
4.2.1. Os comissários políticos foram colocados em tudo o que mexia, desde clubes desportivos, associações culturais, casas do po(l)vo, qual cancro estendido a toda a sociedade civil. E que ainda se mantém.
4.3. Os ensinos particulares e cooperativos foram, inicial e relativamente, 'deixados em paz'. Pelo menos enquanto não se verificou uma sucessiva degradação das condições de vida das famílias da classe média do Funchal (a classe mais sacrificada em termos de políticas fiscais). Era esta classe média que, ainda, tinha a oportunidade de, até aos anos 90, optar entre o ensino público e o ensino particular e/ou cooperativo.
4.4. No que toca, por exemplo, ao ensino primário, uma mudança estrutural foi a obrigatoriedade de todos os tipos de ensino seguir os mesmos programas pedagógicos emitidos pelo Ministério da Educação ou pela Secretaria Regional da Educação.
4.4.1. Antes havia completa liberdade de ensino (logo, de conteúdos) pois que os alunos do privado, cooperativo e religioso chegavam ao 4.º ano (4.ª classe) e faziam um exame de admissão ao Liceu ou à Escola Industrial e Comercial do Funchal.
4.4.2. Esta metodologia de ensino levava os Pais e Encarregados de Educação a analisarem (se não quisessem seguir pela 'fama'...) ofertas educativas verdadeiramente diferenciadas e não unitárias como nos dias de hoje.
4.5. Quando Alberto João Jardim começou a ver a curva descendente dos resultados eleitorais deixou de ser suficiente o controlo do ensino público. Por outro lado, havia professores vinculados à função pública sem possibilidade de colocação nos quadros da escola pública (o caso dos professores de educação física era gritante). Daí uma estratégia de "estalinização" do ensino regional, em clara e sucessiva violação da Constituição da República Portuguesa, desenvolvida à socapa por um ex-membro da UDP (e dos Amigos do Basquete..) colocado em secretário regional; e seguida até aos dias de hoje.
5. Em que se materializou o 'estalinismo' do ensino regional? Para já, com a formalização de contratos de associação e de financiamento ao estabelecimentos do ensino particular e cooperativo (à qual muitos não tiveram outra hipótese que não a da subscrição: atendendo, precisamente, à, acima referida, degradação das condições económicas das famílias madeirenses).
5.1. As contrapartidas dessa 'associação' foram a perda da autonomia pedagógica de cada escola e a colocação de professores excedentários dos quadros públicos.
5.2. A realidade sócio-económica determinou, por outro lado, que os professores preferissem o ensino público ao ensino particular (na região - excluindo o ensino religioso - muitas escolas privadas e cooperativas não tinham 'meios libertos líquidos' para assegurar uma estabilidade e progressão de carreira que o sector público proporcionava: basta comparar os contratos colectivos de trabalho do pessoal docente no ensino particular e cooperativo com o regime da função pública).
6. O cenário atrás descrito (e que qualquer pessoa verdadeiramente isenta poderá, pelo menos, considerar, para não dizer confirmar), em vez de dar a todas as famílias a opção pelo tipo de instrução que desejassem para os seus educandos, ao invés, fez com que, na região, prevalecesse o lema laranja: 'uma só via: a social-democracia'. Quem ousasse pensar diferente ou seguir outro rumo era ostracizado, para não dizer trucidado.
6.1. Muitos estabelecimentos que se destacavam pela componente artística que proporcionavam aos seus alunos tiveram de priorizar o ensino tecnológico, satisfazendo o lobby das empresas de informáticas (MC Computadores em destaque também nesta área...) e dar seguimento à estupidificação generalizada do ensino, pois a arte implica raciocínio e a criatividade, enquanto na tecnologia apenas seguem-se instruções. A ordem é: executa sem pensar. Pois a qualquer poder vigente não interessa pessoas que questionem as suas próprias ordens. Assim é mais fácil garantir a sua própria longevidade.
7. A doutrina laranjo-estalinista fez esquecer o entendimento segundo o qual a liberdade de Ensino reparte-se em duas: na liberdade de aprender e na liberdade de ensinar (autonomia pedagógica).
7.1. Daí que a «xenofobização» das escolas privadas acaba por ser um favor feito ao poder político.
7.2. Tudo seria resolvido com relativa facilidade se, num quadro regional em que a maioria das famílias não tem a possibilidade de optar pelo tipo de ensino que deseja, em vez do governo financiar directamente as escolas não públicas, o financiamento fosse dirigido directamente a essas mesmas famílias, recapitalizando-as e dando-lhes, assim e verdadeiramente, uma opção de escolha (no pressuposto da recuperação da autonomia pedagógica em cada tipo de escola).
8. O controlo global do ensino estendeu-se ainda aos sindicatos de professores, sendo o caso mais chocante o daquele que viu o governo construir um edifício-sede (com a estátua da professora de mamas à mostra na ponte) e destacar, a tempo inteiro, professores para... esse mesmo sindicato.
8.1. Como os favores pagam-se, os sindicatos não ousam afrontar o poder nem os professores se organizam numa Ordem independente que queira 'cortar a direito' e apontar o dedo na(s) ferida(s) da sua profissão e, por conseguinte, no ensino, tendo em conta o fim e a razão de ser dessa sua profissão: os alunos.
8.2. Os alunos passaram a ser "carne para canhão", despidos, na sua maioria, de sentido crítico e muito mais susceptíveis à indisciplina, mais tarde à violência, a modas estéreis e a vícios como os vídeo-jogos, a bebida (quantos casos de cirrose de miúdos de 12/14 anos foram parar às urgências do Hospital, desde a Rua das Fontes?...) e a toxicodependência.
8.3. O ensino católico continua a defender a submissão da mulher a uma sociedade masculina, pois é assim que sucede na organização da própria Igreja (não há mulheres-padres, sendo que a respectiva presença nas cerimónias religiosas é apenas para... servir), muito preocupada em esconder que (não fique chocado/a) Maria Madalena terá sido um dos apóstolos de Cristo e com quem terá casado, segundo as escrituras perdidas do Cairo. Não será de estranhar, por exemplo, as situações de violência doméstica resultantes dessa mesma submissão.
8.4. Os professores passaram a ser, maioritariamente, técnicos de ensino e da propaganda (ideológica) governamental, tal como os jornalistas deixaram de o ser para passarem a meros técnicos de propaganda e, mais tarde, 'técnicos especialistas governamentais' (#MarsílioForever). Uns e outros perderam o sentido de Missão e transformaram a sua vocação numa... provocação a todos nós.
8.5. Nem uns nem outros percebem que esta perda de liberdade (a troco do dinheiro ou do conformismo e egoísmo individual) tem como consequência futura o crescimento do autoritarismo e o totalitarismo de pensamento único, de rosto 'carvalhiano', afinal, como diz no preâmbulo da Constituição, o "caminho para o socialismo". E da social-democracia que é o lado B do socialismo (quem não se recorda que o PPD/PSD quis aderir à Internacional Socialista?...).
9. Por outro lado, colocar todos os estabelecimentos privados no mesmo saco será um vício de raciocínio, resultante de qualquer generalização. Houve e há estabelecimentos de ensino particular elitistas, que foram sempre protegidos por Jardim, pois as novas elites endinheiradas (e funcionários políticos) tinham lá a frequentar os seus filhos. Aos que não tinham essa 'sorte de hospedagem', a rigidez e inflexibilidade dos serviços da educação chegava a ser atroz, para não dizer insidiosa.
9.1. Se há estabelecimentos privados ou cooperativos que recebem financiamento público, aos mesmos não poderá ser arrogado o direito de admissão de alunos, sob pena de violação do princípio da igualdade e da não discriminação. Os que não têm esse financiamento podem, obviamente, determinar as suas próprias regras. Resta saber quem é que é e quem não é financiado. Não se deve é, como acima referi, generalizar.
Este artigo não pretende ser um tratado a respeito do Ensino. Apenas faço votos para que esta temática não seja analisada de forma superficial e que todos os que, genuinamente, sobre a mesma se pronunciam (ou aqueles que, no futuro pós-arguido imune, queiram trabalhar em prol de todos) fiquem com mais esta análise nos seus apontamentos.
Não tenho, nem quero ter (como Jardim, Jaime Filipe e Albuquerque, pela real - e ainda actual - ordem de importância...), a verdade absoluta, nem qualquer interesse pessoal ou económico no ensino; apenas desejo que um ponto de vista diferenciado permita a uns recuperar o que (devido à propaganda, à intoxicação social, às aparências e à 'especialização intensiva' dos assuntos, que fez esquecer o quadro completo) muitos terão perdido: a capacidade de raciocinar.
Lamento pelas crianças e jovens e, concomitantemente, pelos adultos que se esqueceram como é ser criança. Como disse o professor Agostinho da Silva, citando-o de memória, "a pessoa mais feliz terá sido aquela que nunca deixou de ser criança".
Enviado por Denúncia Anónima
Sexta-feira, 12 de julho de 2024
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