O incendio que lavrou na nossa floresta durante quase duas semanas, calcinando e destruindo milhares de hectares das mais variadas espécies, nomeadamente as que integram a Laurissilva, começou, como quase todos, por uma pequena e simples fogueira; se a ignição da mesma se ficou a dever à queda de sobrantes de artifícios pirotécnicos ou a uma outra qualquer atitude ou comportamento negligente, não importa para o caso; infelizmente, é com isso que de há muito convivemos.
O que nos deve preocupar neste momento, porque certamente se repetirá, é a forma estática, meramente contemplativa e laxista, com que a primeira equipa de bombeiros (da Ribeira Brava) encarou a situação quando chegou ao local e se deparou com a tal pequena fogueira. Muitos dos populares que se encontravam nas proximidades, preocupados com a possibilidade de a dita fogueira poder propagar-se à vegetação circundante, tranquilizaram-se com a chegada da referida equipa….
Só que, ao que parece, alegando que o foco se encontrava em local de difícil acesso, a equipa optou por solicitar à Proteção Civil a ativação do meio aéreo (helicóptero)!!! Importa esclarecer que, segundo os populares que assistiram a esta triste (mas infelizmente recorrente) cena, a dita fogueira apenas se encontrava do outro lado da ribeira, pelo que bastaria que atravessassem a ponte existente nas proximidades - a cerca de duas dezenas de metros - com algum equipamento sapador – pás, enxadas, batedores - e a situação ficaria rapidamente resolvida; sim, resolvida muito antes da chegada do meio aéreo que, aliás, quando lá chegou, a situação havia evoluído perigosamente!!! E, infelizmente, com as consequências que todos nós hoje conhecemos.
Sem pretender de qualquer forma branquear alguns erros de gestão por parte dos responsáveis do governo e proteção civil, que também não terão contribuído atempadamente com as melhores soluções e opções estratégicas para resolver o problema – matérias que claramente não domino -, cinjo-me a alguns aspetos de menor interesse mediático mas que, ainda assim, têm desafiado a minha compreensão; elencaria os que se seguem, com enfoque na Corporação dos Bombeiros da Ribeira Brava:
- Onde se encontravam, à hora em que terá ocorrido a ignição, os meios da corporação empenhados no designado POCIR;
- Não seria, operacional e taticamente recomendado, que, face às condições meteorológicas conhecidas e amplamente difundidas, designadamente pelos OCS, conjugadas com a forte possibilidade de, apesar das recomendações em contrário, poderem ser lançados foguetes durante as festividades que decorriam na Serra de Água, existir pelo menos um meio POCIR em vigilância apertada e permanente no local?
- Existe relatório da intervenção inicial, do qual constem as justificações para a inação da equipa, bem como os fundamentos para a ativação do meio aéreo em detrimento de uma primeira intervenção apeada?
- E já agora, por falar em operacionalidade, e uma vez que o comandante da corporação se terá envolvido ativamente nas operações de combate na sua área de atuação, – o que louvamos -, por que razão não se mostrou até hoje? Estará com receio de ser confrontado com a negligente e habitual postura dos seus comandados, na abordagem inicial ao fogo? Estrará a tentar redimir-se pelo comportamento dos seus homens? Teme que possa existir atribuição direta de responsabilidades? Será este desaparecimento uma opção estratégica ou apenas mais uma manobra tática?
- E em Câmara de Lobos? Sabem que a habitual pasmaceira e falta de liderança do comandante se refletiu, uma vez mais, na desastrosa e negligente abordagem à intervenção inicial bem como à ausência total de coordenação em fases posteriores, designadamente na corrida, boca dos namorados e fajã das galinhas! E quanto a responsabilidades? Haverá? Ou mais uma vez estes comportamentos passarão incólumes, ou serão mesmo, escandalosa e ridiculamente, objeto de louvores?
Enfim, passemos à frente. Todos nós temos ouvido opiniões de eminentes especialistas em gestão de incêndios florestais, que nos ajudam a compreender um pouco melhor a enorme complexidade e dinâmicas de um fenómeno aterrador, que se autoalimenta com sofreguidão e voracidade inimagináveis; como temos também, infelizmente, assistido a um desfile de vaidades e a um coro de entediantes lugares comuns, alguns exigindo a cabeça dos responsáveis políticos, outros, menos arrogantes, defendendo a adoção de medidas há tantos anos propagadas, e desde sempre adiadas.
De facto, são sobejamente conhecidas as medidas de há muito preconizadas para enfrentar a ameaça dos incêndios florestais na ilha; o ordenamento florestal e a gestão dos combustíveis, surgem, naturalmente, à cabeça das soluções. Não significa isto que se descure a capacidade intervenção e combate, designadamente com recurso a meios aéreos.
Mas é necessário, sobretudo, que a nossa capacidade de intervenção terrestre, muitas vezes necessariamente apeada, seja robusta e consistente, aliás, como muito bem fazem os bombeiros vindos do continente, e que deveriam fazer os nossos corarem de vergonha. Sim, porque estes nossos bombeiros estão de tal forma inchados com o estatuto de bombeiros sapadores que lhes foi levianamente prometido, que se julgam demasiado importantes para trabalho florestal apeado. Desconhecem - não apenas eles – que a essência do sapador é precisamente fazer trabalho de sapa! Ou seja, tendo a pá (sapa) como ferramenta, abrir valas fossos (faixas de contenção) e outras tarefas concorrentes para a contenção e supressão do fogo.
Se, em vez de garantir a estes bombeiros o estatuto de pseudo sapadores, que para a esmagadora maioria é imerecido, para além de ridículo, patético e populista, a região apostasse na criação de equipas de verdadeiros sapadores florestais, coordenados pelo IFCN e Proteção Civil, os resultados seriam incomensuravelmente superiores aos decorrentes de um estatuto que, para a grande maioria, apenas vai premiar o comodismo, a incompetência e o laxismo.
E não se julgue que nos referimos apenas aos bombeiros; as chefias e comandos, infelizmente, para além de largamente responsáveis pela atual situação, padecem dos mesmos vícios e males, e, como não podia deixar de ser, estão na primeira linha para agarrar o novo estatuto.
Enviado por Denúncia Anónima
Quarta-feira, 28 de Agosto de 2024
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