O colete da redenção


N ada como um bom colete de voluntariado para lavar a imagem política. É impressionante, um dia surgem manchetes sobre má gestão e controvérsias, e no seguinte, lá estão eles sorridentes, de colete fluorescente, segurando uma latinha da Liga Portuguesa Contra o Cancro, Micaela e seu súbito da saúde Edilberto.

Fotógrafos prontos, sorrisos ensaiados, e… click! Mais uma prova de “proximidade com o povo”. Pena é que o povo saiba muito bem distinguir solidariedade de encenação.

É fácil posar com o colete. O difícil é saber quantas horas durou o voluntariado real. Ficaram o dia inteiro na rua, ou foi só o tempo suficiente para garantir a fotografia certa? Porque pedir donativos aos outros enquanto se administra mal o que já se tem… é um exercício de ironia digno de prémio.

A caridade é nobre, quando é genuína. Quando se transforma em decoração política, perde o sentido e ofende quem realmente dá de si, sem câmaras nem assessores.

O voluntariado é um gesto de empatia; transformá-lo em marketing é apenas mais um reflexo de um sistema que confunde imagem com integridade.

Aquele colete serviu para recolher fundos… ou apenas para cobrir a má consciência?

Há milagres modernos que mereciam estudo científico. Um deles é o efeito purificador do colete de voluntariado. Basta vesti-lo e, por encanto, desaparecem polémicas, má gestão e promessas por cumprir. Um passe mágico: de político em apuros a anjo solidário, tudo em menos de cinco minutos e com fotografia incluída.

E lá estavam eles, sorridentes, de colete da Liga Portuguesa Contra o Cancro, a “ajudar” na rua. Que ternura.

Pedir donativos ao povo é fácil, o difícil é olhar para ele sem ver um adereço de campanha. E é preciso ter uma boa dose de lata para erguer a latinha da caridade quando, por trás, há tanta conta por acertar.

O voluntariado é coisa séria. É o gesto de quem dá sem esperar nada em troca. Mas neste teatro político, até a solidariedade tem figurino, e o colete serve mais como disfarce do que como símbolo.

É sempre o mesmo guião, quando a imagem está arranhada, veste-se o colete, sorri-se para a câmara e pronto, redenção instantânea. O problema é que o povo já percebeu o truque.