É tempo de dissipar as névoas da ignorância deliberada e confrontar a contabilidade moral da nação. A narrativa de que o Rendimento Social de Inserção (RSI) financia uma vida de ócio luxuoso em esplanadas é uma falácia económica, destilada pela retórica da direita portuguesa para desviar o olhar do verdadeiro balanço social. Tal invenção não é apenas desonesta; é um insulto ao raciocínio lógico e à prudência que se exige no debate público.
O RSI, com a sua matemática austera, é a última linha de liquidez social, um gesto de sobriedade financeira perante a extrema carência. Não é um salário, nem um dividendo de prosperidade, mas antes uma injecção de capital mínimo para a sobrevivência, destinada a quem já esgotou todos os recursos próprios. A sua natureza bifacetada — prestação em numerário e contrato de inserção — espelha o princípio aristotélico de que a verdadeira ajuda visa a autonomia, e não a dependência perpétua. O objectivo não é meramente transferir fundos, mas sim reintroduzir o indivíduo no ciclo económico activo.
Que verdade revelam os registos desta prestação?
O valor de referência para 2025 - 242,23€ - é o fundamento contabilístico da mentira desmascarada. Este montante, miserável na sua frugalidade, mal chega à linha de crédito da subsistência. A fórmula de cálculo é de uma transparência gélida, baseada numa proporção geométrica da carência: 100% para o titular (€ 242,23), 70% para o adulto adicional (€ 169,56) e 50% para cada menor (€ 121,12).
Pense-se numa família tipo: dois adultos e duas crianças. O seu "capital" de referência ascende a uns escassos € 654,03. O valor final, sublinhe-se, é sempre a diferença entre este teto e os rendimentos já existentes. O RSI é, pois, o ajustamento final para fechar o défice orçamental da fome — um subsídio que complementa a miséria, mas nunca a substitui. É, na sua essência, um cálculo de sobrevivência que sublinha a fragilidade dos seus beneficiários.
É inaceitável que se utilize a fraqueza alheia como arma política. Esta retórica populista da direita, que distorce a verdade factual e financeira do apoio social, é um acto de profunda má-fé e um sintoma de falha cívica. Revela uma mente que se recusa a ascender à forma ideal da justiça distributiva, preferindo o cálculo egoísta.
O RSI não é um fundo de investimento, mas sim a última migalha de pão que a sociedade oferece. É um imperativo de equilíbrio social e de integração que, segundo a ética estóica, devemos aceitar como uma das responsabilidades inalienáveis da comunidade. O desejo que se formula, com a serenidade do sábio, é que aqueles que tão amargamente criticam esta parca ajuda nunca venham a conhecer a contabilidade da necessidade extrema que a justifica. Expor esta verdade é um exercício de clareza lúcida e de honestidade intelectual.
