Absurdos fiscais


Vaquinha mona lisa.

T empos difíceis, caro leitor. Jovens casais à procura de casa, cada vez mais pessoas a viver em casa dos pais. Pais esses que já têm a vida (quase) feita, a casa praticamente paga, mas que continuam, depois de décadas de trabalho, a sustentar filhos já em idade adulta e muitas vezes também a trabalhar. Encontrar uma casa para viver tornou-se difícil, caro e, para muitos, simplesmente impossível.

É inegável: vivemos do turismo. Podemos discutir outros setores, mas é o turismo que faz o dinheiro circular na Região. No entanto, as pessoas precisam de casa. Os madeirenses de gema, a nossa gente, nós. O Alojamento Local não deve ser condenado. Para muitos proprietários, representa “um dinheirinho” extra. O problema surge quando isso acontece à custa do acesso à habitação por parte de quem trabalha e quer apenas uma casa para viver, uma habitação principal, nuclear.

A exploração intensiva da habitação, concentrada nas mãos de poucos, exige mecanismos eficazes de correção. E é aqui que o sistema falha:

  • Tens uma casa em AL? Tens um pacote fiscal.
  • Tens duas casas em AL? Tens… o mesmo pacote fiscal.
  • Tens cinco, dez ou mais casas em AL? Exatamente a mesma fiscalidade.

Isto é absurdo. Não faz sentido. É profundamente injusto para quem procura casa — mesmo que seja apenas uma casa para arrendamento de longa duração. Não é socialmente inteligente tratar todos da mesma forma, nem economicamente racional aplicar o mesmo regime fiscal a realidades completamente distintas.

É por isso que se impõe um princípio simples e justo: quem tem mais casas em AL deve contribuir mais. Um agravamento fiscal progressivo a partir da segunda habitação permitiria distinguir claramente quem quer ganhar um extra, do que fazem atividade económica intensiva.

Isto é como os escalões progressivos do IRS. Aqui, a ideia é aplicada ao número de imóveis afetos ao AL por cada proprietário. Desta forma, não se penaliza quem tem uma única casa, mas cria-se um desincentivo claro à concentração excessiva de habitação em regime de alojamento temporário.

Ao mesmo tempo, esta abordagem permite incentivar o arrendamento de longa duração, através de reduções de IRS e outros benefícios fiscais para os proprietários que convertam imóveis de AL em habitação permanente. Regular não é apenas penalizar; é orientar o mercado.

Estas medidas devem, naturalmente, ser adaptadas à realidade territorial. Não é a mesma coisa ter um AL na Fajã do Penedo ou numa zona de baixa densidade, do que nas Neves ou no Palheiro Ferreiro. A regulação tem de ser sensível ao território.

Caro leitor, se continuarmos a tratar a habitação como um simples ativo financeiro, estaremos a prolongar e a aprofundar esta crise, beneficiando alguns bolsos, à custa de muitos cidadãos. Regular o Alojamento Local é procurar equilíbrio entre o modelo turístico que sustenta a Madeira e a vida de quem cá vive e quer viver com dignidade.

Porque a casa, antes de ser um produto, deve voltar a ser, em primeiro lugar, um lugar para viver!