A via pedagógica


Ex.mo Senhor Vereador Dr. Bruno Pereira,

P ermita-me uma saudação especial, parabéns por ter introduzido no léxico urbano da Madeira um conceito verdadeiramente revolucionário, a via pedagógica. Confesso que, ao início, pensei que fosse um erro de digitação. Talvez uma "via pedonal"? Ou uma "via paralítica", dado o trânsito? Mas não via pedagógica. Tão ousado que nem os suecos, que inventaram o IKEA e os Volvo, pensaram nisso.

Para esclarecer, uma via pedagógica, pelo que percebemos (ou tentamos perceber, vá), é aquela em que o objetivo não é tanto fluir o trânsito, mas sim ensinar o condutor a ter paciência budista, a dominar a arte milenar do ponto de embraiagem e a contemplar, com serenidade, o carro da frente que não anda. Sim, porque nada educa melhor um cidadão do que estar parado 45 minutos a olhar para um semáforo que insiste em vermelhar a nossa alma.

Ora, Sr. Vereador, como bons alunos desta nova escola rodoviária filosófica, temos algumas dúvidas existenciais:

Se o trânsito no Funchal é uma lição, qual é o exame final? Um AVC ao volante?

A quem se destina a pedagogia? Aos condutores, aos peões ou aos turistas?

Vamos então, humildemente, propor-lhe um pequeno plano de ensino alternativo — chamemos-lhe “Mobilidade 101 para Governantes Desligados”:

  1. Criação de um Plano de Mobilidade Sustentável a sério. Sim, com estudos técnicos verdadeiros, que incluam horários de pico, rotas escolares, zonas de carga e descida de passageiros. Não é magia. É planeamento.
  2. Transportes públicos que funcionem como relógios suíços, não como cucos. Mais frequências, mais conforto, e horários que respeitem quem trabalha. Porque o carro não é uma escolha quando o autocarro nunca aparece.
  3. Zonas de acalmia de tráfego reais, com alternativas. Reduzir o trânsito no centro? Excelente. Mas com alternativas reais e estacionamento funcional, não só rotundas em horários de missa.
  4. Reabilitar passeios, criar ciclovias verdadeiras e incentivar a mobilidade suave. Pedagogia urbana é ensinar que nem tudo se faz de carro, mas isso exige que andar a pé ou de bicicleta não seja um desporto de risco.
  5. Diálogo com a população e transparência nas decisões.

Surpreenda-nos: faça sessões públicas, ouça quem realmente vive os trajetos todos os dias. Ensinar é escutar, não decretar.

Sr. Vereador, a pedagogia é uma coisa maravilhosa, quando tem conteúdo, método e empatia. No trânsito, porém, o povo não precisa de lições de moral nem de metáforas educativas. Precisa de soluções funcionais. Com as ruas do Funchal mais parecidas com um tabuleiro de Jumanji do que com uma cidade europeia moderna, talvez esteja na hora de trocar a régua pedagógica por um pouco de bom senso.

Um cidadão que já tirou carta e só quer chegar a casa sem aprender mais nada no caminho