O governante afirmou que a tendência é de tornar o bordado mais atual e prático. São feitos trabalhos com menos horas de trabalho e que, por isso, saem mais baratas sem perderem a qualidade. (link)
E ra uma vez o Bordado Madeira, orgulho insular, suor entranhado em linho, tradição passada de mão calejada em mão calejada, geração após geração. Era uma arte. Hoje, Miguel Albuquerque tenta embrulhá-lo em papel de embrulho dourado, tipo loja gourmet para turista endinheirado, com "queques" vestidos de "Madeira Dress" a sorrir em passarelas de plástico.
No vídeo, vemos Albuquerque a empunhar a narrativa da “renovação do Bordado Madeira”. Fala de design, fala de inovação, como se a tradição fosse um tapete velho para ser escondido debaixo do sofá do marketing. E ali, sem pestanejar, tenta transformar o Bordado Madeira, símbolo visceral da nossa cultura, num produto "instagramável" para meia dúzia de elites de conveniência.
Para provar a grande “renovação”, levou como modelos a Graça, a Susana, a Lídia e a favorecida do regime, Nini Andrade, como se a inclusão de meia dúzia de nomes mascarasse décadas de injustiça.
Mas a verdade, Senhor Presidente, e aqui falamos preto no branco, é que o bordado foi durante décadas o motor de exploração de milhares de mulheres madeirenses.
As bordadeiras ganhavam tostões. Enquanto o bordado era vendido a peso de ouro nas lojas de turistas, as mulheres - as verdadeiras artistas! - viviam na penúria, numa lógica quase colonial dentro da própria terra.
Era o Paquistão no Atlântico, mas em vez de camisolas para a Primark, eram sonhos bordados com sangue, suor e lágrimas em tecidos finíssimos.
A "renovação" que agora querem apregoar não é renovação. É requentamento de uma injustiça histórica com purpurina em cima. Mudaram os vestidos, fizeram uns posts no Instagram, meteram uma palavra inglesa ("Madeira Dress") — mas na essência, a injustiça continua invisível no discurso.
Pergunto:
- Onde estão os apoios reais para as bordadeiras?
- Onde está o pagamento digno pelo trabalho artístico?
- Onde está a preservação autêntica, com formação, reconhecimento e verdadeira autonomia para quem borda?
O que vemos é só vitrine. Só espetáculo. Um desfile de vaidade para disfarçar o vazio. O Bordado Madeira não precisa de "inovação de fachada" feita para parecer "cool" no mercado de luxo.
- Precisa de respeito.
- Precisa de reparação histórica.
- Precisa de ser devolvido a quem o criou — o povo madeirense, as mulheres anónimas que bordaram os nossos sonhos.
Enquanto isso não acontecer, tudo isto que o Governo Regional anda a vender é showroom de hipocrisia.
O bordado é uma herança. Não é uma hashtag.
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