Reitor em pose de posse, entre as palminhas e o pânico institucional


E sta semana, o Reitor da Universidade da Madeira toma posse com a pompa e circunstância a que já nos habituaram estes rituais académicos, togas engomadas, discursos vagos, apertos de mão solenes e aquele ar de “tudo está bem na academia”, que só não engana quem lá trabalha. Porque, enquanto se ouvem os violinos de fundo e os discursos sobre “excelência, transparência e futuro”, nos corredores da Universidade da Madeira o ambiente cheira menos a ciência e mais a tensão laboral mal disfarçada. O clima interno anda tão denso que daria para cortar à tesoura e servir em fatias na cantina.

Falemos dos concursos internos, essa modalidade criativa onde, com impressionante regularidade, o vencedor já é conhecido antes sequer de abrir o edital. Currículos? Publicações? Mérito académico? Isso são pormenores irritantes que só atrapalham. O que realmente conta é o fator “cunhocracia avançada”, com critérios tão objetivos quanto “ser do círculo certo”, “almoçar com as pessoas certas” ou, em casos de grande inovação, “não fazer ondas”. Os resultados dos concursos atrasam-se mais do que um estudante de Erasmus à segunda-feira de manhã, e quando saem, confirmam o que todos já sabiam, os lugares são atribuídos como lugares marcados num autocarro escolar. Só falta a plaquinha com o nome. Mas calma, não se critique, isto é “gestão estratégica dos recursos humanos”. Ou seja, distribuir os tachos sem partir os ovos da indignação pública.

No coração desta farsa simpática está o clima laboral: um ambiente tão carregado de frustração, silêncio estratégico e medo passivo-agressivo, que a única coisa que floresce ali é o cinismo. Mas não é só isso. Seria injusto falar de concursos internos manhosos sem prestar a devida homenagem à protagonista silenciosa da grande comédia administrativa, a Vice-Reitora dos Recursos Humanos. Sim, essa mesma. Aquela que controla os concursos internos… e depois os ganha. É como ser árbitro, jogador, treinador e presidente do clube. Tudo ao mesmo tempo. Uma performance digna de aplauso, ou de auditoria, mas disso falamos pouco. Não se trata apenas de um conflito de interesses. Trata-se da institucionalização da cunha elevada a cargo de gestão. Estamos perante um caso de autoatribuição de mérito onde o mérito consiste, precisamente, em estar no lugar certo para se premiar a si mesma. Inovador? Sem dúvida. Ético? Nem por sombras. Mas eficiente? Oh, sim. Sobretudo a eliminar qualquer esperança de justiça ou transparência na carreira de quem não pertence ao círculo.

E no centro desta opereta institucional está o nosso Reitor, figura decorativa de excelência. Um homem com todas as qualidades para não incomodar ninguém:

  • Evita assumir posições académicas claras como quem evita o pão com glúten: pode causar reações.
  • Tem uma visão tão neutra da universidade que faria um diplomata suíço corar de inveja.
  • E sempre que surge uma polémica, responde com aquele clássico do reitorismo moderno: “estamos a analisar a situação com o devido cuidado”, que é o código académico para “não vamos fazer rigorosamente nada”.

A universidade, esse espaço que devia ser de liberdade crítica, debate intelectual e construção de conhecimento, está a tornar-se uma espécie de repartição pública com powerpoints sobre inovação e uma cultura de medo onde a autonomia serve só para decorar relatórios.

Mas não desesperemos. Afinal, temos cerimónias. Temos discursos. Temos o Reitor com o bastão na mão, a pose de Estado e um ar profundamente comprometido com a estabilidade, sobretudo a dele.

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