N o palco institucional da Universidade da Madeira, o enredo dos concursos académicos ganha contornos de tragicomédia burocrática. O recente artigo do Madeira Opina, “Concursos da UMa, a sombra do atraso e escuridão dos bastidores”, expõe aquilo que há muito se murmura em surdina nos corredores, a gestão dos concursos da UMa é um espetáculo de opacidade, lentidão e conveniência seletiva. Mas o verdadeiro clímax reside na figura do atual reitor, Sílvio Fernandes, protagonista de uma performance jurídica notável, não pela ação, mas pela omissão calculada.
Eleito reitor até ao limite legal da sua permanência, o Professor Fernandes encontrou uma solução engenhosamente discreta para um problema de liderança, simplesmente não liderar. Em vez de assumir a presidência dos júris de concurso, como seria natural e expectável de quem ocupa a mais alta magistratura universitária, opta por um expediente digno de nota de rodapé num tratado de Direito Administrativo Criativo, delega. Delegar é, aliás, a palavra mágica, um verdadeiro escudo legal para quem não tem, perdoe-se a expressão técnica, os tomates para assumir o ónus das decisões.
O professor Fernandes tinha, e tem, todas as condições para assumir com firmeza a presidência dos concursos, como seria expectável de quem ocupa o topo da hierarquia académica. Mas não. Em vez de assumir responsabilidades, optou por uma manobra de bastidores digna de Maquiavel, lava as mãos e delega a presidência dos concursos em terceiros, como quem passa a batata quente sem sequer levantar a tampa da panela. Fica assim, confortavelmente instalado no trono reitoral, sem ter que se chatear com impopularidades ou decisões difíceis. É mais fácil manter-se no palco central enquanto os outros se queimam nas luzes dos holofotes, que aqui pouco iluminam e muito encandeiam. É o retrato de uma liderança que prefere a paz morna da omissão à coragem frontal da acção.
Esta manobra, que à primeira vista poderia parecer um gesto de confiança na colegialidade, revela-se, à luz de uma análise mais fria, uma operação cirúrgica de responsabilidade diluída. O reitor, que nunca se submeteu a concurso público para ascender à sua própria posição académica, recusa agora o papel que a sua função lhe exige, presidir. E fá-lo com requinte. Ao manter-se fora da presidência dos júris, mantém-se também fora de qualquer linha de fogo, fora de qualquer escrutínio directo, fora de qualquer possibilidade de ser responsabilizado por preferências ou omissões, em suma, fora de tudo o que possa manchar o verniz de neutralidade que tão cuidadosamente cultiva.
É uma estratégia brilhante, se o critério for a autopreservação. Afinal, para quê meter as mãos na massa quando se pode ser padeiro honorário, com direito a fotografia no folheto institucional, mas sem nunca sujar o avental?
O mais extraordinário, no entanto, é que esta táctica se concretiza num contexto em que a universidade continua a tropeçar nos prazos, nos procedimentos e, mais grave, nos princípios. Os concursos arrastam-se, as decisões tardam, e a transparência é substituída por relatórios ambíguos e reuniões discretas.
Assim, a Universidade da Madeira prossegue o seu curso, não o académico, mas o da gestão calculada da inércia. E o Professor Sílvio Fernandes? Esse continua serenamente sentado no topo da hierarquia, a assistir ao desenrolar da novela institucional com a tranquilidade de quem sabe que, no fim do dia, não será ele a assinar a ata.
Enquanto isso, os verdadeiros valores académicos, mérito, transparência e responsabilidade, ficam arquivados, empoeirados. E assim se governa, ou melhor, se evita governar, uma instituição de ensino superior no século XXI que caminha para se tornar numa escola profissional. Que triste legado deixará na Madeira, Professor Fernandes…
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