O Natal que não se fala


A realidade silenciosa dos corredores de hospital

O Natal é luz, sim. Mas não é apenas a luz das árvores ou os anúncios de “Boas Festas” que preenchem o ar. O verdadeiro Natal, o que não falamos, é aquele que se vive no silêncio dos corredores de um hospital, onde as mãos se apertam, onde as despedidas acontecem sem palavras, e onde o peso do abandono se sente mais do que qualquer outra coisa.

Enquanto milhares de famílias celebram a alegria e a união, há centenas de pessoas que passam o mês de Dezembro entre máquinas que apitam e rostos cansados, na penumbra de um hospital. Esperam. Esperam por algo que pode ser a última chamada, mas não a do “Feliz Natal”. Esperam pela confirmação de uma verdade que o coração já pressente, mas que a mente se recusa a aceitar. O Natal deles é de suspense, de incerteza, de uma despedida que chega sem aviso.

Este é o lado do Natal que a sociedade prefere ignorar. Aquele lado que não aparece nas luzes brilhantes das ruas ou nas propagandas que inundam os meios de comunicação. Aquele que se esconde nos quartos de hospital, onde as palavras se tornam desnecessárias e onde a dignidade é a única coisa que ainda resta para aqueles que cuidam e para aqueles que partem.

É esse lado do Natal que não deve ser silenciado. Onde estão as vozes de protesto contra o abandono sistemático daqueles que necessitam de cuidado, mas são deixados à margem, como se fossem invisíveis? Onde está a indignação contra um sistema que, enquanto celebra, esquece? A dignidade não tira férias. E o verdadeiro espírito do Natal não está apenas na celebração, mas na presença e no cuidado. Não podemos continuar a ignorar a dor alheia em nome de uma “alegria” forçada.

A sociedade deve ser desafiada a olhar para o lado oculto do Natal. A verdadeira responsabilidade social vai além dos presentes e das comemorações. A verdadeira moralidade é cuidar daqueles que estão em silêncio, à espera de um gesto, à espera de um mínimo de compaixão. O sistema de saúde, especialmente durante a época festiva, deve ser humanizado. O Natal é um tempo para a coexistência da alegria e do cuidado. Não podemos, como sociedade, continuar a tolerar este abandono.

Sim, o Natal é de todos. Todos merecem respeito, dignidade, e um mínimo de humanidade, independentemente da sua condição ou situação. E, enquanto isso, os corredores dos hospitais, de uma maneira macabra, continuam a ser preenchidos com o som do silêncio. O verdadeiro espírito do Natal não se encontra na luz, mas nas mãos que se apertam, nas despedidas silenciosas e na promessa de que, no fim, ainda estamos a cuidar uns dos outros.

Não é um pedido. É um direito. E não se trata de palavras vazias. Trata-se de uma ação urgente e necessária.