Democracia não é espetáculo


A corneta do antigamente.

H á uma pergunta simples que continua a incomodar quem vive do ruído: o Presidente da República serve quem? A resposta está escrita, clara e sem maquilhagem, na Constituição. O Presidente representa todos os portugueses. Não alguns. Não os barulhentos. Não os financiadores. Todos. Quando a função se confunde com claque, a democracia começa a ranger.

Portugal vive num sistema semipresidencial onde o Presidente não governa, modera. É árbitro, não jogador. Garante instituições, não tendências. Quando essa função é usada para legitimar discursos fáceis ou cálculos partidários, perde-se o centro de gravidade do regime. E sem centro, a política vira circo.

Em 2025, a clivagem é óbvia. As políticas de esquerda continuam a provar, com dados e resultados, que proteger salários, serviços públicos e direitos laborais reduz pobreza e aumenta coesão social. Salário mínimo digno, sindicatos fortes, saúde e educação universais não são luxos ideológicos: são infraestruturas democráticas. Já a direita insiste na velha receita: cortar, privatizar, desregular. Promete eficiência, entrega precariedade. Alivia o topo, pressiona a base. Chama liberdade ao abandono.

O problema agrava-se quando riqueza excessiva se transforma em poder político invisível. Democracias não morrem com tanques; morrem com cheques, lobbies e normalização da desigualdade. Quando o sistema parece feito para poucos, cresce o cinismo, a abstenção e o apetite por soluções autoritárias. A história não avisa duas vezes.

Democracia não é um estado natural. É um processo frágil, caro, lento e exigente. Depende de regras escritas e de normas não escritas: aceitar derrotas, reconhecer adversários, respeitar limites. Em sociedades polarizadas, estas normas evaporam. A tecnologia acelera mentiras, a desigualdade alimenta raiva, e a política transforma-se num jogo de soma zero. A apatia faz o resto.

Defender a democracia é dever cívico. Não votar, não questionar, não participar é entregar poder a quem nunca o largará. Direitos não exercidos apodrecem. Liberdades ignoradas desaparecem.

Patriotismo não pertence à extrema-direita. Amar Portugal não é excluir, é cuidar. É garantir que ninguém fica para trás. Nacionalismo cívico é compromisso com justiça social, soberania democrática e dignidade coletiva. É corrigir o que está errado, não fingir que está tudo bem.

Quem confunde gritos com coragem e slogans com soluções não quer governar: quer dominar. A democracia, essa sim, exige menos espetáculo e mais responsabilidade. Menos barulho. Mais substância.