Ai, ai...
E ntão vamos lá imaginar, só por um momento, que as verdadeiras heroínas dos bastidores da saúde, aquelas que ninguém aplaude nas conferências de imprensa nem aparecem nas selfies com ministros, decidem fazer greve.
Sim, sim, estou a falar das auxiliares, das senhoras da limpeza, das cozinheiras dos hospitais. As tais que muitos fingem que não veem, mas que são as primeiras a limpar o que ninguém quer ver, a cuidar de quem ninguém quer tocar, e a alimentar doentes que nem paladar têm, mas ainda assim merecem dignidade.
Agora pensemos: e se um dia, fartos de serem tratados como rodapés humanos, estes profissionais decidissem parar?
Primeiro dia: os corredores do hospital cheiram a antibiótico e ch
ouriço frito da noite anterior. Segundo dia: já não se sabe se o doente está com febre ou se é o ambiente que está tropical. Terceiro dia: começam a surgir mutações no fundo das sanitas. Quarto dia: médicos e enfermeiros começam a servir bolachas maria aos doentes porque a cozinha... foi de férias. Quinto dia: cirurgias canceladas, porque o bloco está sujo e não é de consciências.
E sim, os senhores engravatados das chefias viriam, muito sérios, dizer que “lamentam profundamente os transtornos causados” enquanto metem o croquete ao bolso e voltam para casa, limpa, cheirosa, e com alguém que lhes fez o jantar.
A verdade é simples como o caldo verde de cantina: sem estas mulheres (e alguns homens também, vá), o hospital colapsava. Não era devagarinho, não... era queda livre sem colchão. Porque não há bisturi esterilizado, nem antibiótico eficaz que valha quando o básico falta: limpeza, cuidado, comida quente e presença humana.
São estas pessoas que limpam sangue, urina, vómito e desespero. Que cuidam de avós abandonados e de doentes esquecidos. Que fazem refeições com orçamento de guerra e ainda decoram quem gosta do puré mais líquido.
Mas como não têm jaleco branco nem palavras bonitas, ninguém lhes liga.
Portanto, se um dia fizerem greve, e bem podiam, vamos ver quantos discursos bonitos se conseguem escrever num hospital que cheira a lixo, serve arroz cru e tem corredores onde até os ratos pedem licença para passar.
1 Comentários
Muito obrigado a quem escreveu esta mensagem. Resumidamente está aqui tudo o que nós, Assistentes Operacionais fazemos e sentimos.
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