Provas, ignorância e a cegueira seletiva da Paula Margarido


É espantoso como, em pleno século XXI, ainda temos de perder tempo a explicar o óbvio a certas figuras que insistem em opinar sem qualquer fundamento jurídico. A senhora Paula Margarido, num momento de inspiração, decidiu afirmar que o vídeo da agressão na Madeira não servirá de prova. Uma pérola de ignorância que cai por terra perante a simples leitura do acórdão da Relação de Coimbra de 25.10.2023, que, para quem sabe interpretar, é cristalino.

Comecemos pelo essencial: o argumento de que o vídeo não pode ser usado porque “foi gravado sem autorização” é, no mínimo, uma caricatura do direito. O acórdão é explícito: não basta que a gravação preencha o tipo legal para ser considerada ilícita; é preciso que falte justificação legal. E quando falamos de crimes, agressões e direitos das vítimas, a própria ordem jurídica reconhece a necessidade e a proporcionalidade de usar essas imagens para apurar a verdade. Ou seja, aquilo que a Paula Margarida ignora – ou finge ignorar – é que as exigências de justiça afastam a ilicitude, tornando as gravações válidas como prova.

Mais: se a gravação não foi feita de forma oculta, se ocorreu num espaço público e se não há qualquer violação da privacidade ou intimidade, a conversa sobre “ilicitude” simplesmente não se aplica. O Código Penal e a Constituição são claros: a descoberta da verdade material, a punição do crime e a proteção das vítimas prevalecem sobre a frágil cortina de argumentos que alguns tentam levantar em nome de quem convém.

Portanto, dizer levianamente que o vídeo “não servirá de prova” é não apenas juridicamente errado – é intelectualmente desonesto. É ignorar princípios elementares da justiça, é fechar os olhos à jurisprudência mais recente e, sobretudo, é um insulto às vítimas, a quem o direito reconhece o poder de documentar e provar os crimes de que são alvo.

Senhora Paula Margarido, a ignorância pode ser desculpável. A teimosia em propagar falsidades jurídicas, não. Antes de atirar bitaites, talvez valha a pena ler um acórdão até ao fim. Evita constrangimentos públicos e poupa-nos à triste figura de ter de ver alguém a confundir opinião com direito.

Em suma: o vídeo não só pode servir de prova, como deve. O resto é cortina de fumo, alimentada por quem prefere a proteção do agressor à verdade dos factos.

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