Carta aberta ao excelentíssimo Beto do Naval

Defensor oficial do status quo e patrono dos confortavelmente instalados

O h Beto, meu caro, cá estamos nós outra vez, a tentar explicar-te, pela trigésima vez, o conceito de anonimato. Senta-te aí um bocadinho, respira fundo e tenta, eu sei que é difícil, abrir a mente. Vamos lá outra vez explicar-te, devagarinho, porque é que o Madeira Opina existe de forma anónima.

Sabes, nem toda a gente nasce com o dom divino de ter o nome certo, o apelido certo, o tio certo e o subsídio certo. Há quem viva na ilha real, não naquela bolha climatizada onde o vento da corrupção passa mas não abana.

O anonimato, Beto, é aquela ferramenta maravilhosa que permite às pessoas dizerem a verdade sem perder o emprego, o contrato, ou a amizade do vereador que serve o copo no jantar de gala. É tipo um escudo invisível, algo que, no teu caso, é desnecessário, porque já vens com o modo protegido por contactos ativado desde o berço.

E já agora, sobre essa tua dúvida profunda: “Mas porque é que não dão a cara?”

Ora, Beto, porque alguns têm contas para pagar, casas para sustentar e filhos para criar. Já tu tens tudo isso tratado, casa herdada, salário oferecido e ainda sobra tempo para te preocupares com o anonimato alheio enquanto o caviar chega à mesa.

O Madeira Opina é anónimo porque há quem viva na ilha da realidade, não na ilha dos betos. Uns escrevem com pseudónimo, outros vivem num reality show chamado “Tenho Costas Largas. E Depois?”.

Por isso, relaxa, Beto. Continua a viver no teu condomínio moral, com a consciência tranquila e o ego ventilado. Nós cá fora continuamos a opinar, anónimos, mas lúcidos.

O Madeira Opina existe de forma anónima porque ainda há quem viva numa ilha onde a liberdade de expressão é tratada como um luxo de importação, e não como um direito básico. Há quem não tenha o privilégio de poder dizer o que pensa sem que o primo do tio do cunhado do beto do Naval lhes feche a porta de um emprego, de um contrato, ou até de um simples café.

Tu não percebes isso, Beto, porque o teu mundo vem com subsídio incluído.

Agora, já que gostas tanto de dar lições de moral, deixa que te ensine algo de História:

Os grandes jornais do mundo, The Guardian, Le Monde, The Washington Post, não nasceram nas varandas de marfim de filhos de papá, mas sim de gente que escrevia às escondidas, à luz de velas, com medo da censura e da polícia política. Gente que arriscava a pele, não a reputação no clube de golfe.

Por isso, quando te perguntas porque é que o Madeira Opina é anónimo, lembra-te: nem toda a gente tem o luxo de falar com nome e apelid.

E enquanto houver Betos do Naval, seguros, instalados e protegidos, haverá sempre quem precise de escrever no escuro. Porque é no escuro que a verdade, às vezes, é mais visível.

Com todo o carinho , O incómodo anónimo da tua ilha