Diz-me espelho meu...


P edro Calado, diz-me lá, já pediste autorização ao tribunal para viajar para Bruxelas? É que não queremos surpresas, não é? Uma coisa é ir à capital da Europa, outra é dar um salto a território internacional sem o juiz de instrução saber. Não vá o homem achar que estás a confundir o passaporte diplomático com o de arguido em liberdade condicional.

E tu, Miguelinho, já foste levantar o subsídio de mobilidade para a tua peregrinação europeia? É que Bruxelas não é logo ali, e o contribuinte madeirense gosta de saber que o seu dinheiro anda bem aplicado — nem que seja em milhas aéreas e selfies com eurodeputados.

Mas atenção, Miguelinho, não te esqueças da checklist oficial:

  • Cartão de cidadão (não vá o funcionário desconfiar da tua excelência),
  • Talões de embarque (mesmo que tenhas ido em “classe conforto” – é importante parecer modesto),
  • Recibo-fatura da viagem com as taxas de carbono devidamente discriminadas (porque nada diz “sustentabilidade” como queimar querosene a caminho de uma conferência sobre o ambiente),
  • E, claro, as taxas do aeroporto, que dão sempre aquele toque de autenticidade proletária.

Agora, a grande dúvida que nos corrói é esta: vais tu mesmo aos CTT como qualquer madeirense normal, pegar na senha e esperar duas horas de pé, rodeado de gente a pagar contas e levantar encomendas da Shein? Ou tens já um funcionário público destacado para essa nobre missão — o “assessor da fila”, o verdadeiro herói da mobilidade insular?

És tu que vais à fila dos CTT, com senha na mão, a ouvir o “balcão três, por favor”?

Ou tens um funcionário público de estimação, treinado para aguentar as três horas de fila, com um dossier de documentos e uma lancheira, pronto para defender o teu direito à mobilidade subsidiada?

Não leves a mal, Miguelinho, é só curiosidade sociológica. É que por cá, quando um madeirense comum quer o reembolso da viagem, tem de rezar para que o sistema não vá abaixo, o funcionário não esteja de pausa, e o carimbo esteja na gaveta certa. Já tu, aposto que o teu subsídio viaja em priority boarding, direto para a conta.

O madeirense, aquele que trabalha, paga impostos e voa em promoção Ryanair está ali, nos CTT, com uma pastinha de plástico e esperança no olhar, à espera de ser atendido.

Três guichés fechados, um funcionário a caminho do almoço, e o sistema “em baixo desde ontem”.

Mas não faz mal: o Miguelinho está em Bruxelas, a representar-nos a todos.

Talvez até tire uma selfie com o Pedro Calado (caso o juiz tenha aprovado o roteiro europeu).

Na Madeira, a mobilidade é um direito de todos — mas só alguns é que viajam sem stress.

Uns enfrentam filas, formulários e carimbos; outros enfrentam apenas o dilema entre o hotel de quatro ou cinco estrelas.

Uma dúvida final Miguelinho, quando saíres do governo, vais ter um trabalho à tua espera? Ou vais viver à custa de uma estrangeira sueca que eventualmente te sustentará? Tenho curiosidade em saber, uma vez que nunca trabalhaste…