N ão nasci em berço de ouro, o meu Pai era do Porto da Cruz e trabalhava nas obras em Machico. Era conhecido como o mestre José e aprendeu a arte sozinho, carregando blocos de cimento. Lembro-me dos dias em que se levantava às seis da manhã, molhava um bocado de pão duro num caneco de café de cevada sem açúcar que a minha mãe fervia. Eu era o mais novo de quatro irmãos e o seu preferido.
Era um homem honesto e trabalhador, nunca roubou ou aldrabou ninguém. Recebia pouco pelas horas que trabalhava mas isso permitia-lhe colocar na mesa o milho e a sopa que saciava toda a família.
Das poucas memórias que tenho dele, lembro-me do dia em que faltei à escola porque queria ser como ele, trabalhar nas obras e trazer dinheiro para casa. Por azar meu, dias depois, a ranhosa da professora encontrou o meu Pai e disse-lhe que eu estava a faltar à escola e que podia perder o ano por faltas.
Nessa noite esperou-me e sem me dizer nada tirou o cinto e, enquanto a minha mãe chorava e gritava para que ele parasse, deu-me um malhão ameaçando-me continuar se eu faltasse mais à escola. Nesse dia odiei-o mais que tudo, mas nunca mais faltei à escola.
Enquanto os meus três irmãos seguiram a profissão do meu pai, dediquei-me aos estudos e acabei o 12º no Funchal com média de 18. Quis a sorte que me fosse dada uma Bolsa do Governo Regional e com o dinheiro e o sacrifício de todos, consegui tirar uma licenciatura em medicina. Hoje sou médico e sinto orgulho nas correadas que levei porque isso permitiu-me salvar muitas vidas.
Não sou filho do Miguel Albuquerque, do José Manuel Rodrigues, do Norberto Gomes, do Rui Fontes, do Rui Alves, do José Luís Nunes e muito menos do Ricardo Miguel Oliveira por isso não escrevi isto no Diário.
Mesmo sendo o melhor do Mundo, o meu Pai já morreu mas ainda hoje sinto saudades dele.
Obrigado Pai.
Enviado por Denúncia Anónima.
Domingo, 19 de Março de 2023
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