No rescaldo do RVM


1. O clima de insanidade, excesso e de impunidade que se instala na véspera e durante a prova não é novidade para ninguém. As estradas passam a ser circuitos onde não há lei, controlo ou limites. Há justificação para todo o tipo de infrações. É comum ver pilotos durante os troços de ligação – ou seja, em estrada aberta ao público, lado a lado com peões e demais automobilistas, onde estão obrigados a respeitar as normas da estrada como qualquer outro veículo – a cometer inúmeras infrações sem qualquer consequência: aquecer pneus e travões em plena estrada, excessos de velocidade, ultrapassagens em qualquer sítio, condução perigosa, queimar linhas contínuas, não respeitar passadeiras ou sinais vermelhos, entre tantas outras situações. Do lado da população há ainda que adicionar a condução sob o efeito do álcool. O rali justifica e perdoa tudo. Mas pergunto: Qual é o bem maior que fundamenta a impunidade desta loucura toda? Colocar vidas em risco desta forma serve para quê? Para não penalizar entre classificativas? Passa na cabeça de alguém o ridículo disto? No dia que houver um acidente em troço de ligação, quem se vai responsabilizar? Também fará parte dos “riscos do rali”, de que ninguém tem culpa?

2. As imagens explícitas do atropelo de espectadores (crianças, inclusive) e de animais passam na televisão, em horário nobre, como se nada fosse. Como é que um canal público permite a transmissão continuada destas imagens? É óbvio que a sua captação é uma possibilidade, uma vez que a cobertura é em direto. Agora para quê a sua repetição continuada? Ainda por cima sem qualquer censura, tratamento ou descaracterização. É para chocar? Para ter mais audiências? Não haverá respeito pelas vítimas e respetivos familiares? 

3. Sobre o atropelamento: Quantas vidas os ralis na Madeira já ceifaram? Quantas famílias destruiu? Todos assumem que o rali é perigoso, mas da perspetiva errada: é quase sempre no sentido de que há que aceitar que estas situações acontecem face ao risco de uma competição desta natureza. Acidentes acontecem e ninguém tem culpa. Errado: é exatamente por se ter consciência deste risco que as medidas de segurança de qualquer prova desta natureza têm de ser especialmente pensadas e executadas. Não pode ser deixada margem para a sorte ou azar. Todas as situações controláveis têm de ser impreterivelmente pensadas e asseguradas de antemão.

Deste pressuposto, questiono: É tido em conta, entre tantos outros, a quantidade de álcool consumida pelos espectadores nas classificativas? É garantida a formação devida aos comissários de estrada? O policiamento existente é suficiente? Há investimento suficiente na “educação” e consciencialização dos espectadores – e até dos próprios polícias – para os perigos e imprevistos de uma prova de rali?

Na televisão foi dito que os espectadores atropelados neste RVM não tiveram culpa porque estavam nos sítios assinalados como seguros. Mas alguém questionou se os sítios assinalados como seguros estavam bem assinalados? Como é que se assinala como seguro um sítio que não tem escapatória, onde não há espaço para fugir? Por incrível que pareça apenas o piloto que ali se despistou levantou essa questão (ausência de espaço de fuga).

4. Num programa televisivo que faz a cobertura do RVM e passa num canal público é preciso ter o cuidado de assegurar imparcialidade e objetividade. Muitas críticas foram dirigidas à organização do rali (onde estão incluídos os comissários desportivos), e (independentemente da sua validade) até aqui tudo ok. Acho, contudo, estranho não ter existido a possibilidade de contraditório ou de prestação de esclarecimentos por parte desta entidade no programa no qual as críticas foram feitas, especialmente na emissão de 2.ª feira (se estiver errado, peço desde já desculpa). Apenas no Telejornal de 2.ª feira (e não no programa em causa) é que houve oportunidade de ouvir alguns esclarecimentos por parte da organização, ainda que breves. Nalgumas alturas do programa, inclusive, os próprios convidados/comentadores responderam às questões do apresentador no sentido de que este devia fazer tais perguntas à organização. 

Importa, por isso, perceber se os responsáveis pelo programa procuraram o comentário e/ou os esclarecimentos da organização e esta rejeitou o convite ou se simplesmente não houve tal procura. Se não houve, é mau porque se trata de um canal público no qual há dever acrescido de imparcialidade e objetividade no tratamento e apresentação dos seus conteúdos, o que implicava “ouvir” a posição da organização sobre as críticas que lhe foram dirigidas ao longo do programa (independentemente da validade destas).

5. A cada ano que passa o RVM perde qualidade, prestígio e credibilidade. Os esclarecimentos prestados no Telejornal não convenceram. É preciso renovar a organização do RVM urgentemente. 

Mais do que nunca, urge trazer gente nova, com ideias novas e, no geral, com uma nova abordagem. O RVM está a degradar-se a olhos vistos.

O futuro será o Legends?

Enviado por Denúncia Anónima
Terça-feira, 6 de Agosto de 2024
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