H oje em dia parece que já não basta sobreviver a um acidente. É preciso sobreviver… e depois abrir uma conta de Instagram. A tragédia já não é só tragédia, é oportunidade de “branding pessoal”. Partes as pernas numa mota? Não faz mal, ganhas seguidores. Ficas sem mobilidade? Garante-te mais alcance do que qualquer anúncio pago. No fundo, a dor vende. Sempre vendeu. A diferença é que agora é em formato de reels.
Antes, quem passava por um azar destes recolhia-se, reconstruía-se e seguia a vida. Hoje, não. Hoje a cicatriz tem de ser mostrada em HD, acompanhada de música épica e legendas motivacionais: “Nunca desistas dos teus sonhos”. Não interessa se o sonho era andar de mota a 200 à hora numa curva apertada, o importante é a moral da história e, claro, o engajamento.
E o público adora. Há um fascínio quase mórbido em seguir o “sobrevivente influencer”: meio santo, meio mártir, meio coach de Instagram. É a tragédia convertida em carreira, a dor transformada em mercadoria. Já ninguém se lembra do acidente em si, só das frases feitas que saem dele: “A vida é curta”, “A força está dentro de ti”, “Tudo é possível”. É o supermercado da motivação, e cada um escolhe o slogan que mais lhe convém.
A pergunta que fica é: isto inspira ou entretém? Porque, sejamos sinceros, se inspiração fosse o objetivo, não precisávamos de filtros, nem de hashtags, nem de colaborações com marcas de suplementos. Bastava viver com dignidade e dar o exemplo em silêncio. Mas silêncio não dá likes.