A vitória do PSD - Madeira, mesmo depois de uma série de escândalos judiciais, arguidos e turbulências internas, reflete um conjunto de fatores estruturais e conjunturais que favorecem o partido na região há décadas. Quero aqui abordar alguns factores que explicam este fenómeno:
1. Hegemonia histórica e rede de influência (a segunda é para mim a mais importante)
O PSD governa a Madeira há quase 50 anos. Durante este tempo, criou uma rede de clientelismo e influência em vários setores, incluindo o funcionalismo público, as autarquias e o empresariado local. Até alguma oposição se converte à necessidade de fazer vida em tempo útil. Isto faz com que, apesar dos escândalos, muitos eleitores ainda vejam o partido como a opção mais segura ou temam mudanças bruscas que possam afetar os seus interesses. Os eleitores votam pelo seu interesse e não pela Madeira.
2. Ausência de uma alternativa forte
Apesar do desgaste do PSD, a oposição não conseguiu afirmar-se como uma alternativa credível. O PS, principal partido concorrente, enfrenta problemas internos e não conseguiu capitalizar os escândalos do governo. Outros partidos, continuam incapazes de apresentar um projeto unificado que convença a maioria dos madeirenses. Reconheço que domingo faltou mais PS para poder haver uma coligação. A oposição tem que acordar os abstencionistas como o Chega já conseguiu nas últimas Legislativas Nacionais.
3. Estratégia de comunicação e controlo da narrativa (têm falado do monopólio da narrativa)
O PSD-M mantém um forte controlo sobre os meios de comunicação locais, conseguindo minimizar os danos dos escândalos. Pura e simplesmente o jornalismo escrutina a oposição com tanto para se dizer do PSD que tem o Governo e os problemas judiciais. Perdoa-se tudo ao poder e ataca-se a oposição. Além disso, adotou uma comunicação agressiva, transformando os ataques da oposição em argumentos de "perseguição política" (os coitadinhos). Muitos eleitores acabam por desvalorizar as acusações judiciais, vendo-as como manobras externas para desestabilizar o governo regional, até porque a Justiça trabalha devagar, mas o PSD a fazer narrativas ... não!
4. Dependência do orçamento regional
A Madeira depende fortemente de fundos públicos e subsídios para diversas áreas, como a função pública, as obras públicas e apoios sociais. O PSD utiliza esta dependência em seu favor, passando a ideia de que só ele tem capacidade para garantir a estabilidade económica e a continuidade dos investimentos. Achei piada o PSD corrigir o limiar do erro, o de colocar José Manuel Rodrigues nos Assuntos Sociais, a máquina dos votos.
5. Cultura política e resistência à mudança
A Madeira tem uma cultura política marcada pela personalização do poder e pelo conservadorismo no voto. Até mesmo com cartazes sem rosto. Muitos eleitores, especialmente os mais velhos, mantêm uma fidelidade ao PSD por tradição ou por medo de instabilidade. Além disso, há uma perceção de que "todos os partidos têm problemas", o que leva parte do eleitorado a relativizar os escândalos do PSD. É aqui que nasce o "antes a corrupção do que confusões".
6. Elevada abstenção e voto útil (na sequência do parágrafo anterior)
A abstenção continua a ser alta na Madeira, beneficiando o partido mais estruturado. Os seus vão votar sempre, obcecados nos interesses pessoais. Muitos eleitores descontentes preferem não votar, em vez de arriscar em partidos novos. Além disso, a narrativa do "voto útil" faz com que, na reta final, muitos votem no PSD para evitar governos instáveis. Não entendem o voto útil para mudar.
7. O madeirense lê pouco, presume e anda desinformado. (lamento!)
A falta de leitura e de pensamento crítico leva muitos eleitores a votarem de forma automática nos mesmos partidos, sem questionar políticas, escândalos ou alternativas viáveis. Sem acesso a informação diversificada e sem o hábito de analisar propostas, grande parte do eleitorado forma opiniões baseadas em discursos populistas, narrativas manipuladas pelos meios de comunicação dominantes e lealdades históricas que já não correspondem à realidade. Já viram que, à conta disto, poucos partidos apresentaram programa? Só vi um. O desconhecimento sobre sistemas políticos, economia e governação transforma o voto num acto mecânico, perpetuando ciclos de poder que beneficiam sempre os mesmos grupos. A ausência de leitura não é apenas um problema cultural; é um obstáculo à renovação democrática e à construção de um eleitorado verdadeiramente esclarecido e exigente. Parem de presumir, leiam para detectar as mentiras.
Termino dizendo que houve vitória, mas o desgaste prossegue. Albuquerque pode agradecer a Ramos, Jardim e Correia (que triste fim deste último). Embora o PSD tenha vencido com quase maioria absoluta, os escândalos tiveram algum impacto. O JPP aproveitou, o PS não. A necessidade de coligações e as dificuldades em formar governo mostram que o partido já não tem o domínio absoluto de outros tempos. No entanto, enquanto a oposição não se reorganizar e apresentar uma alternativa clara e mobilizadora, o PSD continuará a beneficiar da sua máquina política e da falta de concorrência séria.
A grande questão agora é: esta vitória foi um último fôlego ou a confirmação de que o PSD-M, mesmo fragilizado, continua inabalável? O futuro político da Madeira dependerá da resposta a esta pergunta. É que parece que há umas alminhas que acham que têm a mesma hipótese de Albuquerque. Aquele de pullover laranja berrante bem se colou na noite eleitoral. O eleitorado dá-lhe esperanças.
P.S.: repararam no vazio de gente no festejo da vitória, os fotógrafos manhosos resolveram. Para a oposição, é isto que é preciso "minar"... Se o PSD estivesse na oposição não perdoaria.
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