As botas de "atanado" e as doenças mentais.


F ui de um tempo que para além das listas da escola acrescentava-se as botas de "atanado", couro puro, verdadeiramente cosido, e um "Kispo", no início massacrava os pés, depois moldavam-se, dava para a intempérie e para jogar futebol, nunca desiludiam e duravam o ano letivo todo. Quando o tempo aquecia, a malta acostumada sentia a "pimenta refresco" em si próprio.

Naquele tempo chovia mais e mais forte do que agora, acho eu, e não me lembro de alertas, mas chovia de balde, uma noite de Kispo pendurado na banheira do WC. Lembro das manhãs breu de Inverno, das levadas entupidas e a água na estrada, das pedras da calçada a "esvarar" e as botas de "atanado" salvavam o tornozelo. Lembro do campo da escola a fazer poça e, quando a bola caía no meio, parava o jogo, porque apesar de todos molhados, era preciso meter os pés em profundidade, o que quase sempre resultava na eleição do gajo com as botas de "atanado". Entre eles, todos tinham ido da última vez.

Antigamente, os alunos andavam mais de autocarro e a pé, enfrentavam mais as intempéries, por vezes começavam namoricos com as intempéries, porque o 4x4 das botas de "atanado" eram a base para pegar na donzela ao colo para não molhar os pés. Era típico uma paragem com uma placa só e a levada  rasa na porta do autocarro.

As botas de atanado também eram a base que segurava a mochila, mais pesada e onde se levava e trazia tudo, porque havia faltas tão graves como não comparecer. Não consta um maior número de corcundas por isso.

Estamos num tempo de florzinhas de estufa, de gente mentalmente mais frágil, os mal educados nunca são mal educados, têm uma doença qualquer, parece aqueles nomes pomposos para levantar o ego na Função Pública. Estamos num tempo em que todos se querem destacar por alguma coisa, é o drama da meteorologia, as participações, os acidentes, os apanhados, compilar as notícias e ser noticieiro, etc, e em cada profissão querem impor regras, depois temos tantas e ninguém cumpre.

É a era da informação e da digitalização e anda tudo mais desinformado e mais desorganizado. Temos muitas doenças mentais porque não jogamos simples e não descomplicamos, mas também porque o dinheiro não chega para a maioria. Agora, a vida moderna não tem um poio que dá tudo à família, é preciso comprar, comprar e comprar, cada vez nos escravizam e exploram mais, ficamos estafados para ter uma família. Por essa razão vale tudo para muitos no emprego, para alcançar bom vencimento e já pouco importa se é o melhor ou não para o cargo. Daqui nascem injustiças, mais doenças mentais de gente a "macacar", gente frustrada no bom sentido da injustiça, sempre a pensar no que lhe fizeram. Nasce a intolerância e a violência (de qualquer tipo). Se tinham umas botas de atanado, bastava uma na tola de um que ele endireitava, é que às vezes folgava-se os atacadores para aliviar e saiam de espoleta... de propósito, nalguns.

As botas de atanado não eram umas Skechers mas faziam-nos felizes pau para toda a obras e intempérie. Esta coisa da vida moderna é uma escravatura, uma injustiça, uma doença mental.

As botas de "atanado" eram muito populares, a internet veio depois e não recuperou a memória, agora só querem coisas para vender aos escravos da vida moderna. Mando uma foto muito aproximada.

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