As motas de água e o assassínio lento do mar madeirense


P or estes dias, basta dar um passeio por qualquer costa da Madeira para perceber que a tranquilidade do mar foi oficialmente substituída por algo mais ruidoso. As motas de água, essas maravilhas do entretenimento motorizado, invadiram as nossas enseadas com o mesmo cuidado de um elefante numa loja de cristais. E com elas, trouxeram um cocktail explosivo de poluição sonora, ambiental e uma total ausência de bom senso.

Não se trata de um ataque gratuito ao lazer aquático, longe disso. Toda a gente tem direito a divertir-se. Mas há uma linha ténue entre usufruir do mar e abusar dele. E, neste momento, o barulho ensurdecedor e os rastos de combustível deixados por estas máquinas mostram bem de que lado da linha estamos.

Na Madeira, onde a biodiversidade marinha é um dos nossos maiores tesouros, permitir que o litoral se transforme num circuito de corridas náuticas é, no mínimo, contraditório. Estamos a promover turismo de natureza com uma mão e, com a outra, a afugentar golfinhos, tartarugas e aves marinhas ao som de motores descontrolados.

Deveríamos preservar o silêncio, a vida marinha e a autenticidade. Mas parece que o rugido de um motor de 200 cavalos, a prioridade é clara adrenalina à força toda, impacto ambiental que espere sentado.

E nem falemos do ruído. Já se tornou comum ouvir o ronco metálico das motas de água em locais onde antes só se escutava o som das ondas. Há turistas que se queixam de não conseguirem relaxar nas praias. Há residentes que já sabem que o sossego de verão vai ser interrompido por sessões improvisadas de “rave” náutica. E há pescadores que, impotentes, veem o peixe fugir antes de terem tempo de lançar a linha.

É caso para perguntar, estamos a ceder a uma ideia de progresso que sacrifica o essencial em nome do superficial? A paisagem marítima da Madeira não precisa de mais velocidade. Precisa de mais respeito. Os madeirenses precisam de respeito.

Usar uma mota de água é uma forma preguiçosa e ruidosa de dizer “não me importo com o lugar onde estou”.

Por isso, talvez esteja na hora de repensar. Regular com seriedade. Proteger com firmeza. E perceber que, se não pusermos travão nesta euforia motorizada, um dia vamos olhar para o mar da Madeira e perguntar, onde foi parar aquilo que o tornava único?

Foi embora. A alta velocidade.