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H oje vi uma foto do Miguel Silva Gouveia ao lado do pseudo candidato do PS e lembrei-me de como a política consegue ser injusta. Quatro anos depois, temos uma procissão de iluminados a acharem-se génios da governação, quando mal distinguem um orçamento de um recibo verde. Prometem o impossível, decoram meia dúzia de frases e acham-se visionários. E, ironicamente, aquele que mais fez pela cidade, aquele que verdadeiramente acho ter capacidade para governar uma cidade, nem sequer é candidato. Miguel Silva Gouveia é, e sempre foi, um político raro: sério, íntegro, com carácter e um sentido de missão que não se compra nem se fabrica. Um homem que entrou na política não para se servir, mas para servir. E isso, nos tempos que correm, é quase um ato de resistência.
Miguel chegou a presidente não por ambição, mas porque o Ruca decidiu abandonar a Câmara para se dedicar a um novo projeto, o assalto ao Governo Regional, em parceria com o seu inseparável companheiro da Figueira. Uma dupla inseparável, qual Bonnie e Clyde da política madeirense, sempre pronta para o golpe seguinte. Para colmatar a fuga do capitão, lá ficou o Miguel ao leme de um navio que mais parecia um cargueiro abandonado, cheio de ratos, buracos e negócios de bastidores. Ainda assim, o “mago das finanças” fez o que sabia fazer melhor: pôs ordem no caos, equilibrou contas, organizou a casa e deixou a Câmara financeiramente estável — algo que poucos conseguem dizer depois de passar por aquela tempestade. A Câmara era, e continua a ser, um verdadeiro antro de interesses, favores trocados e envelopes que circulam com mais rapidez do que as próprias atas das reuniões. E no meio desse lamaçal, o Miguel teve a coragem de não sujar as mãos, o que, convenhamos, é quase um ato de heroísmo em certos corredores do poder. Mas nem isso lhe valeu. A honestidade e o carácter não dão votos quando do outro lado estava o candidato, o eterno “povoador”, e a máquina laranja bem oleada, pronta a distribuir frangos como quem abastece frigoríficos em época eleitoral. Há quem compre votos com promessas, outros preferem fazê-lo com refeições completas.
Depois da derrota, enquanto muitos procuravam um tacho, um cargo ou simplesmente um culpado para apontar o dedo, o Miguel fez o que poucos fariam: voltou ao seu trabalho. Sem precisar de mordomias, sem favores, sem o conforto do poder. Voltou de cabeça erguida e consciência tranquila, com a mesma dignidade de sempre. Continuou a defender os funchalenses, não com discursos ensaiados, mas com trabalho e presença. Enquanto isso, o PS do Ruca, fiel ao seu talento natural para o teatro, entretinha-se em bastidores e reuniões, a tentar transformar a sua própria incompetência numa narrativa convincente.
E o mais curioso disto tudo é que, mesmo depois de tudo o que lhe fizeram, o Miguel continuou igual a si próprio. Enquanto o gangue do Ruca se enredava nas suas tramas de poder e nas intrigas de bastidor dignas de telenovela barata, o Miguel manteve-se firme, decente e presente. Não virou a cara, não entrou nos joguinhos, não precisou de bajular ninguém. Ser íntegro, hoje em dia, é um ato de rebeldia.
Por isso, deixo aqui o meu sincero obrigado ao Miguel Silva Gouveia por, durante quatro anos, ter defendido os funchalenses com seriedade, competência e uma coragem que poucos teriam naquele antro político. E já agora, que o Ruca continue no poleiro do PS regional por mais uns bons 20 anos, ou mais, se assim o preferir. Afinal, temos de reconhecer talento onde ele existe: transformar um partido numa máquina de perder, embalar derrotas e apresentar fiascos como vitórias morais não é para qualquer um. E convenhamos, com o preço das casas e o ordenado de professor como está, o salário de deputado deve dar jeito.