O bem-estar no trabalho deixa de ser luxo para ser lucro.
O recente Grande Reportagem da SIC Notícias, conduzida por Susana Bastos, ilumina uma verdade elementar que teima em ser subestimada no tecido empresarial português: investir na felicidade e bem-estar dos trabalhadores não é uma despesa supérflua, mas antes o motor genuíno de uma produtividade sustentável e, consequentemente, de lucros reais. A peça serve como um eloquente lembrete de que a prosperidade empresarial autêntica floresce com a valorização intrínseca do capital humano, e não à sua custa.
É, por isso, sintomático e francamente lamentável que a interiorização da "felicidade" no meio laboral, através de iniciativas como os ainda raros "departamentos da felicidade" – referidos na reportagem como exemplos isolados de uma visão mais humanizada – continue a ser uma excepção periférica, em vez de uma estratégia central e amplamente adoptada pelas empresas em Portugal. A oferta de mimos como aulas de pintura ou serviços de engomadoria, embora bem-vindos, são apenas a ponta do icebergue de um genuíno bem-estar laboral, nunca podendo substituir salários justos e condições de trabalho dignas.
A constatação de que passamos quase metade das nossas horas de vigília no trabalho sublinha a urgência desta discussão. Trabalhamos por necessidade, ambição ou propósito, mas será que a produtividade – onde Portugal se situa desfavoravelmente na União Europeia, apesar de uma carga horária considerável – não seria exponencialmente impulsionada por um ambiente onde a felicidade não fosse um mero apêndice, mas antes um pilar?
Os exemplos apresentados na reportagem oferecem vislumbres de um futuro mais promissor. A visão de Ricardo Costa, CEO do Grupo Bernardo da Costa, que implementou um "Departamento da Felicidade" em 2014, e a aposta cultural do DST Group, liderado por José Teixeira, que aposta na formação e até em bibliotecas nos estaleiros, demonstram que uma liderança humanizada e uma cultura organizacional rica são tão cruciais como os resultados financeiros. Não se trata de benesses marginais, mas sim de investimentos estratégicos no capital humano, reconhecendo que os trabalhadores realizados são invariavelmente mais produtivos, empenhados e inovadores.
A entrada em vigor, em 2023, da norma portuguesa para a gestão do bem-estar e felicidade organizacional é um passo encorajador. Este "guião" para as empresas, embora ainda com uma adesão incipiente (apenas três certificações até ao momento), sinaliza um reconhecimento crescente da importância de criar locais de trabalho onde as pessoas se sintam bem a nível físico, mental e emocional. Ausenda Oliveira, citada na reportagem, acerta em cheio ao afirmar o enorme potencial desta norma para impactar positivamente o panorama laboral.
No entanto, a responsabilidade pela felicidade no trabalho não recai unicamente sobre os ombros dos empregadores. Os trabalhadores têm também um papel crucial a desempenhar na construção de um ambiente laboral mais saudável e positivo. Afinal, com tanto tempo dedicado à vida profissional, a passividade não é uma opção sustentável.
Urge, por isso, que as organizações portuguesas interiorizem esta premissa fundamental: o tratamento digno dos seus colaboradores não é apenas um imperativo ético, mas também um inegável trunfo estratégico. A persistente cultura de exploração revela uma miopia perante modelos empresariais mais iluminados e, em última análise, mais rentáveis. A felicidade no trabalho não é um luxo a oferecer ocasionalmente, mas antes um investimento essencial para a saúde das empresas e, por extensão, da própria economia nacional. A reportagem da SIC Notícias serve de farol, iluminando o caminho para um futuro onde o bem-estar e a produtividade caminham de mãos dadas.
- Contém o vídeo: Por onde passa o bem-estar e a felicidade no trabalho? (link)
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