Rubina, a verdadeira vítima!


N os últimos dias, muito se tem falado dos insultos proferidos na Assembleia Legislativa da Madeira durante o debate na especialidade do Orçamento Regional para 2025. Entre os muitos comentários indignados e justificados protestos, começou a circular a ideia de que Rubina Leal, presidente da Assembleia, teria sido conivente ou, no mínimo, negligente. Essa acusação, além de injusta, revela um profundo desconhecimento do funcionamento da casa parlamentar — ou, pior ainda, uma intenção deliberada de atacar Rubina por ser quem é.

Convém esclarecer que o episódio em questão não ocorreu numa sessão plenária, mas sim numa reunião da Primeira Comissão Especializada de Política Geral e Juventude, que é presidida por Brício Araújo, com Vítor Freitas como vice-presidente. Foi nesse contexto — fora da alçada direta da presidente da Assembleia — que o secretário regional do Turismo, Eduardo Jesus, proferiu expressões ofensivas contra várias deputadas do PS. O que não se tem dito com o mesmo fervor é que, nessa mesma sessão, o deputado Rafael Nunes, do JPP, também foi alvo de insultos por parte do mesmo governante. E que se saiba, Rafael Nunes não é mulher, não mudou de sexo, não se identifica como transexual nem necessita de proteção mediática em nome de qualquer causa de igualdade de género. Por que razão não houve clamor mediático por esse insulto? A indignação é seletiva?

Não deixa de ser irónico que, neste caso, Rubina Leal esteja a ser acusada de inação, quando não tinha responsabilidade direta na condução dos trabalhos em causa. É Brício Araújo quem presidia à comissão e Vítor Freitas, do PS, quem coadjuvava. Se alguém falhou ao não travar a linguagem ofensiva ou não proteger os deputados visados, foram eles — e não Rubina. Mas é mais fácil apontar o dedo à presidente da Assembleia, talvez por ser mulher, talvez por ser firme, ou talvez por ocupar um cargo que alguns continuam a achar que não lhe devia pertencer.

Rubina Leal é, aliás, vítima recorrente de uma misoginia disfarçada de escrutínio. Quando em 2017 se candidatou à Câmara do Funchal, não faltaram comentários sobre o seu aspeto físico, sobre os “lábios pornográficos” ou insinuações grotescas sobre travestismo — tudo da boca dos mesmos que hoje se dizem paladinos da igualdade e defensores das mulheres. A ironia é ácida: quem não lhe perdoou ser mulher numa posição de liderança, finge agora indignar-se em nome da dignidade feminina.

Mas não nos deixemos enganar. Há os que confundem, por ignorância, a função da presidência da Assembleia com a responsabilidade nas comissões especializadas. E há outros que sabem perfeitamente a diferença, mas escolhem, por conveniência política, atirar o barro a Rubina. Por que motivo não se exige responsabilidades a Brício Araújo ou a Vítor Freitas? Será porque a narrativa não funciona tão bem quando se trata de homens?

Rubina Leal é hoje a primeira mulher a presidir à Assembleia Legislativa da Madeira. Isso por si só já bastaria para ser alvo de desconfiança e má vontade por parte de quem nunca aceitou bem que uma mulher ocupe um cargo de chefia. O que se está a passar agora é mais uma tentativa, disfarçada de zelo democrático, de a fragilizar politicamente. Não é por acaso — é sistemático.

Insultar deputados, sejam homens ou mulheres, é sempre condenável. Mas usar esses insultos como arma para atacar uma mulher que não os proferiu, que não conduzia a sessão onde ocorreram, e que até já apelou a um Parlamento mais digno e respeitador, é não só injusto, como hipócrita. Rubina Leal não precisa de que a defendam por ser mulher; precisa apenas que parem de a atacar por isso.

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