A Polícia mete a Igreja na ordem


H á dois momentos que marcam a história recente da Igreja e as suas festas ao usar foguetes de estalo durante o Verão. Tivemos o enigma da árvore no monte que muitos dizer ter sido da trepidação sonora, inclusive dos foguetes, mas também, e disso temos certeza, por ter provocado o incêndio da Serra d'Água. Mas, por outro lado, ainda colide com o facto de "arder dinheiro" numa terra com muitos e cada vez mais pobres.

Os foguetes de estalo, especialmente durante o verão, não são apenas um adorno folclórico inofensivo. São faíscas lançadas para o ar em plena época de seca, muitas vezes num território já classificado como de alto risco de incêndio. O caso da Serra d’Água é um lembrete doloroso de que a tradição, quando não se adapta às circunstâncias, pode tornar-se tragicamente perigosa. Ao insistir neste costume sem reforçar drasticamente as medidas de segurança (ou repensar o seu formato), a Igreja assume uma quota de responsabilidade que não é apenas moral, mas potencialmente legal.

Depois há o paradoxo económico e social. Há um certo choque ético em ver milhares de euros “arderem” em pólvora e ruído num arquipélago onde a pobreza é uma realidade crescente, e onde muitas famílias têm dificuldade em pagar renda, alimentação ou medicamentos. O argumento do “faz parte da festa” perde força quando o som das explosões ecoa lado a lado com o silêncio das necessidades não satisfeitas. A festa comunitária, no seu melhor, devia unir e amparar; não ostentar e desperdiçar. Às vezes penso que a Igreja precisa tanto de festa como o PSD, por isso se dão lindamente.

O problema não é celebrar. O problema é celebrar de forma inconsciente no contexto atual. A Madeira, tal como outras regiões, poderia preservar o espírito festivo com alternativas menos perigosas e menos dispendiosas: espetáculos de luz, música, arte urbana, ou até iniciativas solidárias integradas nas festas. É possível criar momentos memoráveis sem risco de incêndio e sem “arder dinheiro” em sentido literal. Assim acabam precisando de mais dinheiro para a festa... como o outro.

A crítica não é contra a fé ou a festa, mas contra a falta de adaptação de uma instituição que deveria ser exemplo de cuidado pela vida humana, pela casa comum e pela dignidade das pessoas mais vulneráveis. Afinal, tradição sem reflexão é só repetição e repetir erros é das tradições mais perigosas que existem.

Festa rija é quando a Igreja está à altura da comunidade.

Nota para a PSP: agora falta o pandemónio da Praça do Município quando há missa na Igreja do Colégio, se os fiéis não conseguem dar um passo, façam rampas nas escadaria para levar o carro para dentro da Igreja.