Serva do Povo, não eleita.


Sobre este texto: Quem fala pela Madeira? (link)

Ao Madeira Opina

P rometem-me sempre que aqui se fala de assuntos e não de pessoas. Mas, perdoem-me, como é que não se fala da pessoa quando a própria pessoa É o assunto? Eis a senhora Kathleen Figueiredo Laissy, que chega com um currículo digno de filme de emigração académica de luxo:

  • Mestrado em Gestão de Desenvolvimento, LSE – Londres.
  • Licenciatura em Relações Internacionais, Sussex University.
  • Curso de inglês académico, Durham University.
  • Licenciatura em Ciências Políticas, ULB – Bruxelas.
  • Bacharelato europeu, Escola Europeia de Bruxelas.

E, no campo profissional, um desfile de cargos europeus, gabinetes de Bruxelas, consultorias e “representações”… até que aterra como Coordenadora da Estrutura de Missão do Gabinete de Representação da Madeira em Bruxelas.

Lindo. Só há um problema: o que é que isto tem a ver com a Madeira real?

A Madeira onde:

  • Os salários não chegam para pagar uma casa.
  • Há acidentes rodoviários diários e cada vez mais graves.
  • Faltam camas para os nossos idosos.
  • Turistas invadem a ilha e lucram com ela, enquanto quem cá nasceu vai sendo empurrado para fora.

Mas não… a nossa "representante", tão bem instalada em Bruxelas, provavelmente sabe mais sobre regulamentos europeus para a exportação de sardinhas em lata do que sobre a realidade de quem apanha o autocarro às 6h da manhã para ir trabalhar por 800€.

Ouvi atentamente os links que um escritor do MO partilhou sobre a sua intervenção. Vergonha é pouco. E ainda acumula cargos cuja utilidade é tão transparente quanto um contrato de consultoria do “segredo” regional das finanças. Testa-de-ferro para negócios obscuros? Não digo nada… mas penso.

Madeira Opina, perdoem-me outra vez: aqui o assunto e a pessoa são inseparáveis. Porque se não olharmos para quem está lá, nunca vamos perceber porque é que nada cá muda.

O assunto Kathleen Figueiredo Laissy. Um caso de estudo. Um espécime raro da fauna político-burocrática, cuidadosamente cultivado em estufas internacionais, protegido da intempérie da realidade madeirense.

O currículo é um mapa-múndi académico: Bruxelas, Londres, Sussex, Durham… é quase mais fácil listar os países onde não estudou. Cada linha parece gritar: “Eu sou cosmopolita, vocês não entendem.” Representar a Madeira? Claro, da mesma forma que um turista alemão que comprou casa na Calheta representa a cultura local.

Na ilha, temos gente a trabalhar 40 horas semanais para pagar 40% do salário numa renda miserável. Temos estradas que mais parecem videojogos de corrida. Temos idosos a serem tratados como peças de armazém porque não há camas. E turistas a transformar a ilha num parque temático lucrativo… para eles.

Mas a nossa representante? Está em Bruxelas. Entre reuniões e discursos em eurocratês, a defender os interesses da Madeira — que, curiosamente, nunca coincidem com os interesses de quem cá vive. É quase um talento: falar da ilha sem nunca ter de pisar uma rua cheia de buracos ou entrar num supermercado e ver o preço do leite.

Ouvi atentamente as suas intervenções. Confesso que fiquei dividido entre a vergonha alheia e a suspeita legítima. E aquelas funções acumuladas, tão discretas e mal explicadas… quase parecem saídas do manual “Como ser útil para negócios que ninguém pode saber”.

No fundo, o “assunto” é simples: como é que alguém que vive num mundo paralelo, feito de acrónimos europeus e convívios em receções diplomáticas, pode falar por uma ilha que sangra diariamente?

Madeira Opina, desculpem, mas aqui a pessoa é o assunto — e o assunto é que a pessoa não tem nada a ver connosco.

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