Até a juíza goza com os Anjos


N ão sei como seria na Madeira se houvesse um humorista ousado e independente perante este regime, porque há coisas muito estranhas a se passar no MP e Justiça daqui, que o diga a última sabida onde a mentira em currículo para ganhar vantagem, o que destrói o mérito e a verdade, se normaliza:

“Embora seja civil e moralmente relevante, a mentira, por si só, ainda não é criminalizada no nosso ordenamento jurídico” - refere o Procurador do MP (sobre as declarações falsas apresentadas por Liliana Rodrigues no seu Currículo e que lhe valeu a vitória no concurso da UMa) no despacho de arquivamento do processo-crime interposto pelos lesados Nelson Veríssimo e Alice Mendonça (link)

Será que esta decisão coloca a Justiça do continente zelosa da Opinião Pública onde está o humor? Possivelmente. E faz jurisprudência?

A Madeira estabelece um clima de fragilidade do mérito e da verdade face a alegadas anomalias no sistema de justiça local (MP) e a "normalização" de comportamentos como a mentira curricular para ganho de vantagem. Neste cenário, a figura do humorista ousado e independente transforma-se de mero artista para um agente fiscalizador essencial. Vejo isso muitas vezes no Madeira Opina, penso que é das coisas mais dilacerantes para os prevaricadores. O DN que reflita as guaridas e destaques que dá.

O humor crítico tem a função social de ridicularizar o poder, a assunção dele e as suas incongruências. Quando a justiça é vista como permeável ou "estranha", como no caso que destrói o mérito, o riso torna-se o último bastião de sanidade e o grito público contra a impunidade.

Numa região onde os laços de poder são por vezes mais estreitos e a opinião pública menos vasta do que no continente, a ousadia acarreta um risco real de retaliação, seja política, económica ou, mais relevante, judicial. A dificuldade está em manter essa independência quando as estruturas de controlo e investigação (como o MP e a Justiça) estão sob escrutínio ou críticas locais.

A decisão de absolver Joana Marques, na ação movida pela dupla Anjos por um pedido de indemnização superior a um milhão de euros, é um sinal forte e inequívoco da Justiça do continente. Os fundamentos por detrás de absolvições em casos de sátira e humor geralmente ancoram-se em dois princípios constitucionais:

  • O humor, a sátira e a crítica ácida são parte integrante da liberdade de expressão (artigo 37.º da Constituição). O tribunal, ao rejeitar a ação, implicitamente reconhece que, apesar de poder ser "mau" ou "doloroso" para o visado, o humor só é ilícito se exceder grosseiramente os limites de uma crítica social aceitável, atingindo o núcleo duro da dignidade pessoal de forma injustificada.
  • O desempenho público de figuras ou grupos (como a atuação do hino nacional) está sujeito a escrutínio e crítica, mesmo que satírica.

Será que esta decisão de absolvição de Joana Marques coloca a Justiça do continente zelosa da Opinião Pública, sítio onde também está o humor?

Sim, decisivamente. A decisão demonstra um alinhamento com a jurisprudência europeia e constitucional que protege a sátira. Ao considerar o caso dos Anjos "improcedente" perante um pedido avultado, o tribunal sinaliza que não será um instrumento fácil para calar vozes críticas ou punir o humor que incomoda. É uma forma de a Justiça proteger o espaço da Opinião Pública e a crítica (que inclui o humor) como pilares democráticos.

E faz jurisprudência?

Num sistema de Civil Law como o português, as decisões dos tribunais inferiores não criam jurisprudência vinculativa para os tribunais de grau idêntico ou inferior. No entanto, uma decisão desta natureza tem um enorme peso:

  • Serve como um forte e influente ponto de referência para outros juízes. Face a uma situação similar que envolva humor e liberdade de expressão, um juiz terá de ter motivos muito fortes para se desviar desta "orientação" de proteção ao humorista.
  • Se esta absolvição for confirmada em instâncias superiores (Tribunal da Relação ou Supremo Tribunal de Justiça), consolida-se uma linha de pensamento que prioriza a liberdade de expressão face ao direito à honra, quando o humorista atua no contexto da sátira e do interesse público.

O escudo da jurisprudência, a ideia desenvolve-se, assim, num paradoxo. A Fragilidade do Crítico em Madeira: Onde a perceção de justiça é turva (o caso da "mentira no currículo que se normaliza"), o humorista local sente o peso do risco. O caso Joana Marques estabelece uma clara linha de proteção ao humor, reconhecendo o seu valor na Opinião Pública.

O grande valor da absolvição de Joana Marques, para um hipotético humorista na Madeira, não é um precedente jurídico formal, mas sim um escudo ideológico e legal poderoso. Ele reforça a ideia de que, em última instância, a lei protege quem usa a sátira para questionar, ridicularizar ou desafiar o poder, independentemente de onde essa voz se faça ouvir no território nacional. O medo da retaliação judicial local tem de se confrontar com a tendência clara de Lisboa de proteger a essência da crítica democrática.

Uma lição para os autores perante tantos lobas e lobos sedentos... Anjos e Santos.