CHEGA de barulho


Quando a política se transforma em poluição sonora.

O pá, vamos ser honestos: já não há paciência. E não, isto não é um desabafo de quem anda distraído ou mal-humorado com a vida. É o reflexo cru de um cansaço coletivo que grita nas ruas de São Vicente. Cansaço esse alimentado pelo ruído constante, pela propaganda barata e pela insistência em fazer da política um circo ambulante que mais parece querer conquistar os ouvidos pela saturação do que pelas ideias.

Quem vive aqui sabe. Acordar ao domingo com carros de campanha a trovejar pelas ruas, altifalantes a vomitar promessas vagas e críticas ocas, cartazes espalhados como ervas daninhas nos cantos mais inesperados da freguesia — é disso que se trata. Não é campanha, é invasão. Não é persuasão, é poluição.

CHEGA, literalmente.

A política devia ser espaço de debate, confronto de ideias, construção coletiva. Em vez disso, temos carros a passar de cinco em cinco minutos, com slogans repetidos à exaustão, como se a repetição de frases feitas substituísse o conteúdo. E mais grave ainda: com um tom agressivo, por vezes malcriado, como se a raiva fosse um programa político. Não é.

Há um equívoco grave — e perigoso — em confundir liberdade de expressão com abuso de espaço público e auditivo. Há uma diferença clara entre participar na democracia e transformá-la num megafone de queixas sem soluções. E é aqui que está o ponto fulcral: o problema não é fazer campanha. É a maneira como se faz campanha. É a ausência de respeito pelos outros, pela sua paz, pelo seu tempo, pelo seu descanso.

Sim, descanso. Palavra proibida em tempos eleitorais, pelos vistos. Parece que São Vicente deixou de ser uma freguesia para se tornar numa zona de guerra sonora. E para quê? Para ouvir mais do mesmo: insultos aos outros partidos, teorias de conspiração, alarmismos fáceis e, quando muito, ideias soltas sem qualquer base técnica ou viabilidade real. É um desfile de indignação fabricada, mascarada de salvação nacional.

Há também uma ironia cruel nisto tudo. Um partido que se diz "contra o sistema", mas que participa nele como qualquer outro. Um partido que fala de valores, mas cuja prática pública muitas vezes resvala para o desrespeito. Um partido que acusa os outros de serem "do poleiro", mas que demonstra uma sede de poder digna de nota — e de alarme.

Não há qualquer problema em ter um posicionamento político, seja ele qual for. Democracia é isso mesmo: pluralidade. Mas pluralidade não significa ruído, intimidação, exagero. A convivência democrática não pode ser atropelada pelo populismo acústico de quem acha que a razão se impõe pelo volume.