Quando o lucro substitui o ser humano.


O pesadelo Norte-Americano

É imperativo os Madeirenses acordem.

H á quem confunda liberdade com ausência de regras, e iniciativa com abandono. O capitalismo norte-americano é o exemplo perfeito dessa confusão: um sistema que produz abundância e, paradoxalmente, miséria.

Nos Estados Unidos, quase tudo é privado, da saúde à educação, da segurança ao futuro. O Estado intervém apenas onde o lucro é incerto ou o risco é demasiado grande: nas forças armadas, nas infraestruturas, e em programas mínimos de segurança social. É um país que idolatra o “livre mercado”, mas vive acorrentado a ele.

A economia americana assenta numa fé quase religiosa no individualismo. Cada cidadão é o seu próprio Estado. Doença, desemprego, velhice, tudo se transforma em fardo pessoal. Um seguro de saúde familiar pode custar mais de 20 mil dólares por ano; uma simples ambulância, dois mil. Um parto sem seguro pode equivaler a um carro novo. Ironia amarga: o país mais rico do mundo é também o que mais teme adoecer.

O custo da sobrevivência é tão alto que milhões vivem endividados, exaustos e assustados. O sonho americano tornou-se o pesadelo de pagar para existir. É um sistema que recompensa o capital e pune o corpo, onde a saúde é mercadoria e a dignidade um luxo.

Enquanto Wall Street multiplica lucros, as escolas públicas degradam-se e as rendas consomem metade dos salários. A educação depende do código postal; nascer num bairro pobre é, em muitos casos, nascer condenado. A desigualdade, já estrutural, é mascarada por slogans de mérito e liberdade — conceitos belos, mas vazios quando a base é desigual.

Em contrapartida, o Estado Social europeu, e em particular o português, representa um pacto civilizacional. É o reconhecimento de que a sociedade existe para proteger o ser humano, não para explorá-lo. O Serviço Nacional de Saúde, a Educação Pública e a Segurança Social não são caridade: são o resultado de séculos de progresso moral e político.

Em Portugal, o Estado-Providência garante que ninguém seja deixado para trás. Financia-se através dos impostos, um dever cívico que sustenta hospitais, escolas, pensões e apoios sociais. Ao redistribuir a riqueza, o Estado cria coesão, justiça e estabilidade. É essa rede que impede que a liberdade se torne privilégio.

Adotar um modelo à americana seria abdicar desse equilíbrio. Seria trocar segurança por incerteza, direitos por dívidas, cidadania por consumo. O que em Portugal é garantido, saúde, educação, dignidade, nos EUA é comprado, e caro.

A lição é simples, embora raramente ouvida: uma sociedade sem Estado Social não é livre, é vulnerável. O verdadeiro progresso não se mede em PIB, mas na paz interior de quem sabe que, se cair, não cairá sozinho.

Por isso, agradeçamos o óbvio: viver num país com Estado Social é um privilégio civilizacional. Que nunca nos esqueçamos disso, nem o troquemos por um modelo que transformou o “sonho americano” num pesadelo capitalista de proporções globais.