A auto-fiscalização na Madeira, mais uma fantochada.


A Autonomia da Madeira foi sendo moldada, não para aproximar o poder das populações, mas para criar um ecossistema de "auto-fiscalização" que permite a impunidade total e que acho que nem a Justiça vai ser capaz de acusar alguém da maneira como a vejo. A Justiça só atua com os fracos sem dinheiro para bons advogados.

Na Madeira, a estrutura do poder parece ter sido desenhada com um objetivo circular, o órgão que executa é, direta ou indiretamente, o mesmo que avalia a execução. Esta arquitetura da omissão manifesta-se em várias frentes, é o labirinto da auto-fiscalização, a Ilha sem sentinelas, a ilha dos tão puros e honrados que dispensa controlo.

A criação de gabinetes com nomes virtuosos, como o Gabinete da Paisagem ou estruturas de Combate à Corrupção, funciona muitas vezes como uma "manobra de diversão" institucional. Ao institucionalizar a defesa da paisagem dentro do próprio "Governo do Betão", retira-se o poder de intervenção a entidades independentes. O resultado é a cosmética, o gabinete existe para validar a obra por inoperância, não para a travar. Quando os órgãos que deveriam vigiar a integridade pública estão povoados por figuras inertes designadas por gente sob suspeita judicial, a fiscalização torna-se um simulacro.

Numa democracia saudável, a Assembleia Legislativa Regional deveria ser o cão de guarda do Executivo. Contudo, décadas de maiorias absolutas (diretas ou por via de acordos de incidência parlamentar) transformaram o parlamento num eco do Governo. As comissões de inquérito são frequentemente bloqueadas, esvaziadas, deturpadas ou instrumentalizadas. A fiscalização política é substituída pela disciplina de voto.

O debate sobre o PRR(fiscalização)  e os fundos europeus é relegado para gabinetes técnicos controlados pela tutela, longe do escrutínio público rigoroso.

A promiscuidade entre o Público e o Privado é intensa. Chega-se à estupidez. quem se lembra do episódio histórico envolvendo o ex-secretário Sérgio Marques que revelou a face mais crua desta "ideia fixa". A tentativa de esvaziar o LREC (Laboratório Regional de Engenharia Civil), um organismo público de aferição de qualidade e segurança, para entregar a fiscalização aos próprios consórcios privados (como o Grupo AFA) representa o auge do conflito de interesses. Se quem constrói é quem fiscaliza, a segurança e o erário público tornam-se reféns do lucro. O modelo aplicado no Novo Hospital é o exemplo vivo desta transferência de soberania pública para o setor privado. E caiu laje e houve falecidos, no que difere a Madeira daquela falta de observância dos direitos humanos do Mundial do Qatar? Sabiam que há pilares da Via Rápida a serem reforçados? Porquê? Tudo em silêncio.

As propostas de aprofundamento da Autonomia e de revisão constitucional, embora apresentadas como progresso democrático, ocultam frequentemente um desejo de isolamento jurídico. Ao tentar reduzir a influência dos tribunais nacionais, do Tribunal de Contas ou dos representantes da República, o objetivo subjacente parece ser a criação de uma "jurisdição de exceção", onde as regras de transparência são ditadas localmente por quem delas beneficia. Uma Autonomia com Escudo Jurídico.

A ideia fixa de não haver fiscalização na Madeira não é um acidente, mas um projeto. Ao capturar as instituições de controlo, o poder regional garante que a roda do betão continue a girar sem interrupções judiciais ou éticas. A autonomia, que deveria ser um instrumento de liberdade, corre o risco de se tornar uma muralha que protege o "esquema" da luz da verdade.

Hoje o Governo Regional consubtância o Gabinente da Transparência e Prevenção da Corrupção, mais um faz de conta em causa própria, se calhar um organismo para ajudar a melhorar as fraquezas dos esquemas...