Paula Margarido e a reinvenção do chicote social


A Paula Margarido acordou um dia e pensou: "como é que posso mostrar ao país que percebo zero de pobreza, exclusão social ou dignidade humana?" E zás: saiu-lhe esta pérola – obrigar os beneficiários do subsídio de inserção social a fazer trabalho comunitário. Brilhante. A nova política social de Paula é, na prática, uma reciclagem do velho bordão “quem não trabalha, não come”, embrulhado num panfleto com clipart de mãos dadas e sorrisos forçados.

Porque, claro, quem está em situação de pobreza está assim por escolha, por desleixo, por vadiagem. Não tem nada a ver com desemprego estrutural, com salários miseráveis, com uma habitação impossível ou com uma máquina burocrática que trata os pobres como lixo administrativo. Não, isso é tudo detalhe. O verdadeiro problema são os malandros que se atrevem a ser pobres e ainda por cima pedem ajuda.

Paula Margarido quer reeducar os pobres. Castigá-los com um sorriso. Porque, na cabeça dela, receber um apoio mínimo para não passar fome já é luxo a mais – é quase um resort. Então, toca a pô-los a trabalhar “para a comunidade”, de preferência com colete fluorescente e sob o olhar julgador da sociedade. Uma espécie de prestação social com humilhação incluída. Tudo muito pedagógico.

E quem não quiser? Leva um chuto no subsídio. Claro. Porque, para esta senhora, o Estado social não serve para amparar – serve para controlar, punir e envergonhar. É caridade com prazo e condições, desde que o pobre se porte bem e agradeça de chapéu na mão.

Curiosamente, não vemos Paula Margarido a propor trabalho comunitário para gestores bancários que receberam milhões em ajudas públicas. Nem para os políticos reformados aos 50 com três pensões. Nem para os que fogem aos impostos enquanto falam de “mérito”. Não. Esses são "agentes económicos". Os pobres é que são o problema.

No fundo, o que Paula propõe não é política, é vingança de classe. Um recado claro: “se não tens dinheiro, então que te vejam a esfregar chão. Talvez aprendas alguma coisa.”

Pois fique a saber, Dra. Margarido, que o que estas pessoas precisam não é de uma pá e de um castigo, é de respeito, de justiça social, de oportunidades reais. E talvez de políticos que falem menos e ouçam mais. Porque há ideias perigosas e depois há as suas.

A Paula, com a sua sensibilidade social digna de um tijolo, decidiu que estas pessoas precisam é de "dar à sola". Nada como varrer ruas ou pintar escolas para resolver os problemas estruturais da pobreza. Brilhante.

Evidentemente, ninguém pensou que muitos destes beneficiários são mães solteiras, pessoas com problemas de saúde mental, reformados com pensões de miséria, ou simplesmente pessoas em situação de exclusão que não precisam de castigos disfarçados de políticas públicas. Não, isso seria pedir demais.

A ideia parece saída de uma reunião entre o Salazar e um gestor de recursos humanos da Amazon: “Se querem comer, que trabalhem! E de graça, de preferência.” Porque, claro, trabalho comunitário não é trabalho – é só uma espécie de estágio não remunerado para pobres.

Mas atenção, é tudo pela dignidade! Nada diz "dignidade" como ser obrigado a varrer uma praça às 7 da manhã com supervisão, enquanto o senhor do condomínio do lado reclama que está mal varrido. Paula, francamente, se o plano é esse, propomos que o Parlamento também vá dar uma ajuda à comunidade: lavar escadas de prédios sociais, ajudar nos lares e talvez, quem sabe, fazer uma visita ao mundo real.

Enfim, obrigado, Paula Margarido, por nos lembrares que em Portugal a pobreza não é um problema a resolver, é uma coisa a castigar.

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