Jornal São Vicente: o porta-voz escondido da hipocrisia.


Antes de mais quero agradecer a existência deste espaço, o Correio da Madeira (Madeira Opina), pelo debate, exposição de ideias e denúncias publicas.

A final, pasme-se: o Jornal São Vicente parece ter descoberto uma nova vocação, bem mais curiosa do que a de informar. Em vez de cumprir a missão básica de qualquer órgão de comunicação social — relatar factos de interesse público — decidiu abraçar um papel que nunca lhe foi atribuído: o de dar “likes” seletivos a comentários de militantes e simpatizantes de uma só cor política.

Pode parecer detalhe menor, mas não é. Num concelho pequeno, onde cada gesto tem peso simbólico, o simples ato de um jornal demonstrar preferência nas opiniões dos leitores revela aquilo que muitos já suspeitavam: parcialidade mascarada de isenção. E quando um jornal se põe a concordar ou discordar, em vez de apenas noticiar, perde imediatamente a legitimidade de se apresentar como veículo da “verdade dos factos”.

A questão é simples: um jornal não é um militante. Um jornal não deve levantar bandeiras, não deve acenar corações, não deve distribuir aplausos partidários em perfis pessoais de cidadãos. O espaço das redes sociais serve para debate entre leitores, para a troca livre de argumentos e opiniões. Mas o jornal? Esse deveria ser árbitro, não jogador.

Ora, o que se viu no caso recente é inaceitável. Um comentário numa página pessoal de Facebook gerou reação não apenas de outros utilizadores, mas também do próprio Jornal São Vicente — que se apressou a premiar com “gosto” todas as opiniões alinhadas com um partido específico. Ironia das ironias: o mesmo jornal que proclama estar “ao lado da verdade dos factos” esquece-se de que a verdade não se mede em aplausos virtuais, nem se escolhe consoante a cor da camisola.

O resultado é grave. Porque quando um jornal abdica da imparcialidade, transforma-se. Deixa de ser um meio de informação e passa a ser um megafone. Deixa de ser referência para a comunidade e passa a ser caricatura de si próprio. E, neste caso, assume o papel de porta-voz não oficial de um partido. Sim, em São Vicente, o jornal local já se comporta como um suplemento da máquina política, uma espécie de “folheto encadernado” ao serviço de interesses particulares.

É preciso dizê-lo sem rodeios: isto é hipocrisia. Hipocrisia saloia, atrevida, e perigosa. Um jornal que tanto fala de verdade deveria primeiro praticar a neutralidade que exige. Deveria recusar ser cúmplice em guerras políticas, e não cair na tentação infantil de mostrar a sua simpatia partidária através de cliques apressados.

Mais ainda: se realmente quer tomar partido, que o faça às claras. Que escreva, preto no branco, no cabeçalho da sua página e nas edições impressas: “Somos um órgão partidário.” Ao menos os leitores saberiam ao que vão. Mas fingir imparcialidade enquanto se distribui apoio seletivo é manobra que ofende a inteligência da população.

O jornal não deve esquecer que vive da confiança do público. E confiança não se compra, não se finge, não se manipula. Conquista-se com rigor, seriedade e equidistância. Um jornal que se apresenta como “ao lado da verdade dos factos” e, ao mesmo tempo, mostra alinhamento descarado com um partido, está a trair essa promessa. Está a perder a sua dignidade editorial e, com ela, a confiança dos leitores.

Aqui não se trata de concordar ou discordar de ideologias. Trata-se de um princípio simples e universal: a informação tem de ser livre, transparente e independente. Se o Jornal São Vicente prefere ser altifalante de um partido, que o assuma. Mas não venha vender imparcialidade quando já não passa de propaganda.

Por isso, basta de fingimento. Basta de likes seletivos. Basta de hipocrisia disfarçada de jornalismo. O concelho precisa de notícias, não de truques baratos. Precisa de verdade, não de manipulação. Precisa de imprensa que informe, não de órgãos que se comportam como caixas de ressonância.

Em resumo: chega de hipocrisia saloia no Jornal São Vicente.