Pedro Calado e a sombra do poder


Sinais de uma nostalgia política?

A recente aparição de Pedro Calado na despedida interna de Cristina Pedra, nos Paços do Concelho, reacendeu o debate sobre a sua influência nos bastidores da política madeirense. O episódio, realizado à porta fechada e sem jornalistas, foi justificado como um gesto de cortesia. Mas, num contexto marcado por processos judiciais e suspeitas de corrupção, não deixa de levantar questões sobre transparência e sinais políticos.

Mais grave ainda é a dimensão ética: submeter os trabalhadores da autarquia a um discurso de um presidente cessante, que renunciou ao cargo por força de uma investigação judicial, é um gesto que ultrapassa a mera formalidade. Num serviço público que deve primar pela neutralidade e pela confiança institucional, este tipo de intervenção pode ser interpretado como pressão simbólica ou tentativa de reafirmação de influência.

Calado, que renunciou à presidência da Câmara do Funchal após ter sido detido no âmbito da megaoperação que abalou a governação regional, afirmou publicamente que se afastaria da vida política. Contudo, meses depois, foi apresentado por Miguel Albuquerque como coordenador da campanha do PSD no Funchal, um movimento que surpreendeu até militantes do partido e que muitos interpretaram como um pacto de sobrevivência política.

Este regresso informal contrasta com a imagem que Calado cultivou durante anos: ralis, patrocínios, relógios de luxo e viagens que simbolizavam um estilo de vida opulento. Não é ilegítimo questionar se essa nostalgia pelo protagonismo político e social continua a influenciar os seus passos, mesmo quando insiste que não exerce cargos públicos.

Por outro lado, Cristina Pedra, que assumiu a presidência da Câmara após a renúncia de Calado, tem demonstrado lealdade ao ex-autarca, chegando a reafirmar publicamente a sua convicção na inocência do antigo líder. Essa postura, somada ao gesto de convidá-lo para um evento interno, alimenta especulações sobre futuras nomeações: será que veremos Cristina Pedra ascender a um cargo regional ou à liderança de um instituto público?

Este episódio é um exemplo clássico do fenómeno das portas giratórias. políticos que, mesmo afastados formalmente de funções, continuam a circular entre cargos e esferas de influência, mantendo intactas as redes de poder. Esta prática, ainda que legal, é eticamente questionável porque fragiliza a perceção de imparcialidade e reforça a ideia de que, na Madeira, o poder raramente se perde — apenas muda de forma.

Os cidadãos merecem respostas claras: Pedro Calado está, ou não, afastado da política? E até que ponto gestos como este reforçam a ideia de que a política regional continua refém de interesses pessoais e de uma cultura de portas giratórias.