O Carnaval da Madeira, tal como o conhecemos, é uma festa moldada para o turismo, um espetáculo folclórico sem alma, baseado em influências externas, sobretudo brasileiras. Mas há uma questão que ninguém parece colocar: por que razão um Carnaval numa ilha europeia segue um modelo que nada tem a ver com as suas raízes?
O Carnaval, na sua essência, surgiu na Europa, com tradições enraizadas na Idade Média, nas máscaras de Veneza, nos desfiles satíricos de várias cidades históricas. Era um tempo de inversão de papéis, de crítica social, de ritos ancestrais ligados ao calendário católico e pagão. No entanto, na Madeira, onde essas tradições poderiam ter sido preservadas ou reinterpretadas com autenticidade, optou-se por um modelo genérico, onde as plumas, o samba e os carros alegóricos dominam.
Desde os anos 80, quando João Carlos Abreu, então secretário do Turismo, decidiu transformar o Carnaval num espetáculo comercial e vendável, a festa perdeu qualquer vestígio de autenticidade. Tornou-se um evento plástico, esvaziado de significado, apenas mais um cartaz para atrair visitantes. E os madeirenses? Limitam-se a reproduzir um Carnaval que não lhes pertence, como figurantes num cenário de cartão.
Agora, vamos lá ser sinceros: a Madeira, com a sua "descoberta" lá pelos idos de 1420, ou 1425, ou o que for (de tantas datas apontadas, parece mais uma daquelas festas de aniversário que ninguém lembra bem o dia), não podia exatamente saber o que era o Carnaval. Afinal, cá na ilha, nós não tivemos Idade Média. Quando a Europa estava a fazer máscaras e a dançar com os fantoches no Carnaval, nós nem éramos habitados, a colonização apenas chegou no Renascimento. Portanto, fazer parte da Idade Média europeia não estava muito na nossa agenda, nem nas de quem chegou aqui a fazer a "descoberta". Não foi uma falta de interesse, foi uma questão de cronologia histórica.
Mas voltando ao nosso Carnaval... Impressiona ver como as pessoas se preparam o ano inteiro para o grande evento. Muitos andam literalmente a treinar o ano inteiro, não por amor à tradição, mas pela promessa de um lugar no desfile. E o pior? Alguns até pagam para participar! Mas a triste realidade é que muitos nem sabem como desfilar direito, nem têm corpos dignos de estarem ali. Para quê? Para se estereotiparem ainda mais, como se o verdadeiro Carnaval fosse algo de imagem, e não de identidade.
Ah, como seria bem melhor se tratarem tipo Veneza, com corpo todo coberto, assim mantinham o mistério. Pelo menos, as máscaras ainda serviam para esconder as vergonhas Porque, convenhamos, olhar para certos corpos e certas caras que desfilam no Carnaval da Madeira é um espetáculo de desencanto. Uma tristeza disfarçada, tão estereotipada quanto o governo do PPD nos últimos anos. E está cada vez pior, como o Carnaval.
Basta olhar para o Carnaval de Veneza, que mantém a sua tradição inalterada, sem ceder a modas ou exigências de marketing. Lá, não há necessidade de reinventar a festa todos os anos para se adaptar ao gosto turístico. A tradição é a identidade.
O Carnaval da Madeira poderia ter sido uma manifestação cultural única, um reflexo da história e das influências da ilha. Mas, em vez disso, tornou-se apenas mais uma festa de entretenimento descartável, que pouco ou nada diz sobre o que é verdadeiramente ser madeirense.
Enviado por Denúncia Anónima
Sábado, 8 de março de 2025
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