Cinquenta e um anos de quê, exatamente?


Com 51 anos, o cravo já deveria ser uma árvore,
mas poderia ser um incómodo para alguma obra.

Um cru ajuste de contas com as promessas vãs da libertação, meio século volvido.

O s ecos da revolução deveriam reverberar com a verdade, não esmorecer no murmúrio da desilusão. Enquanto Portugal assinala mais um aniversário do 25 de Abril, a questão paira pesadamente no ar: terá o sonho da libertação coalhado numa amarga realidade? Esta é uma interrogação mordaz sobre o verdadeiro significado da liberdade numa terra ainda amarrada pela injustiça.

O 25 de Abril. Cinquenta e um anos volvidos desde o Dia da Liberdade, e que patético engodo em que isto se tornou, não é verdade? Uma data que deveria trovejar pela nossa história, contudo o seu eco não passa de um sussurro abafado pelo bulício da nossa labuta quotidiana. Por isso, pergunto-vos, de punho cerrado e entranhas em convulsão: que genuína liberdade nos iludimos possuir nesta terra maldita? Liberdade em que raio de aspeto? Em que mísera medida as nossas vidas espelham os próprios ideais que deveriam ter irrompido daquele Abril?

Onde, exijo eu, reside a verdade nua e crua da nossa capacidade de expressarmo-nos sem o gélido aperto do medo a contrair-se-nos à garganta ao mero pensamento de desafiar os bastardos que mandam no poleiro? As palavras são trituradas, medidas, cada sílaba pesada contra o potencial de retaliação invisível. Onde está a maldita liberdade de vivermos vidas de genuíno valor e dignidade quando tantos estão presos nas mandíbulas de uma luta diária contra a penúria e uma fome de oportunidades? Onde estão os nossos direitos fundamentais, esses dogmas sagrados, a serem inequivocamente honrados quando o fedor da impunidade se agarra às jaulas douradas dos poderosos, enquanto os vulneráveis ​​são arrastados pela lama e julgados com uma selvajaria que gela os próprios ossos?

Confiança na sua pretensa justiça? É uma farsa, uma sangrenta pantomima! As balanças estão viciadas, untadas e descaradamente inclinadas a favor de quem tem o vil metal para untar mãos e puxar cordelinhos. Um sistema judicial que se apresenta como cego, contudo os seus olhos estão bem abertos para o brilho do ouro, rigoroso como um sangrento inquisidor com aqueles que nada têm a perder, mas inexplicavelmente mole como manteiga com os tubarões e os seus lacaios. Um sistema mais interessado em silenciar os denunciantes, aqueles com a coragem de denunciar as suas malditas mentiras, do que em escavar o poço pestilento da corrupção e da criminalidade que está a corroer os próprios tendões da nossa sociedade. A sua preciosa "lei e ordem"? Está dobrada, partida, um brinquedo para os avarentos e os arrogantes.

E esta população, esta manada sem espinha dorsal, a arrastar-se como ovelhas para o matadouro, os olhos baixos, as vozes silenciadas por um medo que se enraizou. Tornam-se, através da sua maldita inacção, cúmplices das próprias injustiças que lhes roem os meios de subsistência, os seus futuros, as suas próprias almas. Estes malditos cobardes, estas maravilhas de estupidez, prefeririam virar-se contra aqueles com a têmpera para apontar a podridão no coração da nossa terra, uivando pelo seu sangue, do que confrontar as malditas sanguessugas que nos sugam a vida a todos. Lamberiam as botas dos corruptos, estes malditos sicofantas!

Onde estão agora os malditos visionários? Onde estão os "capitães de Abril" dos nossos dias com o fogo nas entranhas e o aço na espinha dorsal para se erguerem e lutarem por uma liberdade que não seja apenas uma maldita palavra numa página poeirenta, mas uma realidade tangível para todos? Parece que a chama da justa indignação foi extinta por uma maré de apatia e de interesse próprio. O que nos compete, o que temos de maldita maneira de fazer, é sacudir este sono, esta estratégica maldita idiotice, e olhar fixamente para a maldita confusão em que estamos metidos. Precisamos de identificar, com a clareza do olhar de águia, os nossos verdadeiros malditos inimigos – não o pobre coitado da rua a lutar para chegar ao fim do mês, mas os malditos sistemas e práticas que nos mantêm acorrentados. Temos de nos unir, juntar os nossos malditos recursos e planear as nossas malditas ações com a astúcia das raposas e a ferocidade dos lobos, utilizando a denúncia e a pressão cívica como as nossas malditas armas. A mobilização e um maldito despertar da consciência serão as nossas malditas tácticas para desgastar a sua complacência e forçar um maldito ajuste de contas.

Este novo "25 de Abril" precisa de maldita maneira de irromper aqui, na nossa Madeira, uma terra que está a maldita maneira a gritar por atenção às suas próprias malditas lutas e vergonhas particulares. É tempo de maldita maneira de abandonar a passividade. Precisamos de uma maldita liderança inspiradora, não destes malditos charlatães, e de uma maldita disciplina cívica que nos mantenha focados no objetivo. Maldita informação e maldita inteligência sobre o estado do jogo serão cruciais para antecipar os vossos malditos movimentos e evitar cair nas vossas malditas armadilhas.

A verdadeira liberdade não é uma maldita esmola, um berloque que acenam para nos manter calados. É uma maldita batalha, uma contínua maldita luta que exige uma constante maldita vigilância, a maldita coragem de questionar cada maldita coisa e uma maldita acção concertada para derrubar o seu maldito edifício de mentiras e injustiça. Que este aniversário do 25 de Abril não seja apenas mais um maldito dia no calendário, mas um maldito catalisador, um maldito grito de guerra para um novo maldito ciclo de luta por uma genuína, não adulterada liberdade, aqui na Madeira e em toda a maldita extensão de Portugal!

A luta pela genuína liberdade está longe de terminar. Que este aniversário não seja uma mera nota de rodapé histórica, mas um maldito e obstinado grito de guerra para uma nova luta, uma que exige que agarremos a promessa não cumprida daquela alvorada de Abril, aqui na Madeira e por toda a nação.

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