História ignorada e lições perdidas.


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N ão entendo a arrogância no modo como tantas sociedades ignoram as lições do passado. Os livros de história estão cheios de advertências para não repetirmos os erros, de civilizações que colapsaram por excesso de confiança, cidades que venderam a alma ao lucro imediato, comunidades que perderam o equilíbrio entre crescimento e bem-estar. Podemos ver como, geração após geração, os mesmos erros repetem-se como se fossem novos. Eu identifico arrogância.

Mas se falarmos em experiência da história recente ou contemporâneo, a situação não melhora. Região Autónoma da Madeira é hoje um exemplo vivo desta recusa em aprender com a História e a experiência dos outros, sobretudo no que diz respeito ao turismo. O arquipélago, que sempre soube tirar partido da sua beleza natural, da hospitalidade das suas gentes e da sua posição geográfica, está agora a seguir o mesmo caminho que tantas outras regiões do mundo já trilharam: o da massificação descontrolada. Basta olhar para destinos como Barcelona, Veneza ou as ilhas gregas para perceber o que acontece quando o turismo ultrapassa o ponto de equilíbrio: inflação galopante, desertificação das zonas urbanas por parte da população residente, substituição de comércio tradicional por negócios voltados exclusivamente para o visitante, degradação ambiental e, ironicamente, perda de autenticidade, o mesmo valor que originalmente atraiu os turistas.

Esta gente que governa não viaja? Não querem saber? Têm compromissos com as clientelas partidárias?

Na Madeira, os sinais estão por todo o lado. O custo de vida dispara, impulsionado por um mercado de arrendamento esmagado por alojamentos locais. Os jovens madeirenses são empurrados para a periferia, ou para fora da ilha, por não conseguirem pagar uma casa no seu próprio território. Apesar do sucesso que o GR "vende", ele não chega aos ordenados dos madeirenses. 

Mas, também o pequeno comércio perde espaço para franchises globais, e as políticas públicas parecem cada vez mais orientadas para agradar o visitante em vez de proteger o residente. A economia cresce, sim, mas cresce de forma desigual, e com um preço social e ambiental que muitos preferem ignorar até ser demasiado tarde.

O mais inquietante é que tudo isto podia ser evitado, ou pelo menos mitigado, com a coragem de aprender com o que já se sabe. A História não é apenas um conjunto de datas e factos: é um repositório de experiências humanas. Estão lá os avisos. Estão lá os exemplos. Mas, como em tantas outras áreas, falta visão a longo prazo e vontade política de contrariar os interesses imediatos.

Ignorar a História é um luxo perigoso. No caso da Madeira, pode significar perder precisamente aquilo que a torna única e, paradoxalmente, valiosa aos olhos do mundo. O futuro da ilha não pode ser apenas um produto turístico; tem de ser uma casa viável, digna e sustentável para quem nela vive todos os dias. E isso começa com um gesto simples, mas revolucionário: escutar o que a História tem para nos dizer e espreitar a experiência dos outros.

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