Dois pesos, duas medidas: habitação acessível sob a gestação da IHM


N a Região Autónoma da Madeira, estão a ser entregues habitações construídas com apoio do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), um fundo europeu criado para ajudar os países a recuperarem da pandemia e a reforçarem áreas essenciais, como a habitação. Estas casas destinam-se a arrendamento acessível, com rendas entre os 250€ e os 700€, e visam apoiar famílias com rendimentos intermédios, que não conseguem acompanhar os preços do mercado, mas que também não se enquadram na habitação social tradicional.

No entanto, o que está a acontecer na prática levanta sérias preocupações.

Em certos empreendimentos, algumas habitações estão a ser atribuídas em regime de arrendamento social, com rendas simbólicas a rondar os 50€ e tal por mês. Ou seja, num mesmo prédio, há pessoas a pagar uma renda justa para a sua realidade, mas elevada para os seus rendimentos, e outras a pagar menos de um sexto do valor, apesar de viverem lado a lado nas mesmas condições.

Para muitos, isto representa uma enorme injustiça. Além disso, estes prédios foram projetados, licenciados e financiados ao abrigo de regras que definem claramente os objetivos do programa. Quando estas regras não são respeitadas, não só se desvirtua a finalidade do projeto, como se arrisca a violar os compromissos assumidos com a União Europeia, pondo em causa o financiamento europeu.

A situação torna-se ainda mais grave quando se sabe que no concelho onde o empreendimento foi construído, não houve candidaturas elegíveis suficientes para ocupar todas as casas disponíveis. Ou seja, parte das habitações ficaram sem destinatários dentro do perfil definido pelo programa.

Em vez de reavaliar o processo ou alargar o período de candidaturas, as entidades gestoras optaram por atribuir as casas em regime de habitação social, preenchendo os fogos com candidatos de outros programas. Isto levanta uma questão essencial: foram feitos estudos prévios sérios sobre as necessidades habitacionais reais desse concelho? Ou tratou-se de uma decisão política mal fundamentada, sem planeamento adequado?

A habitação pública deve ser atribuída com base em critérios transparentes, justos e rigorosos. Os apoios europeus exigem o mesmo. Quando falham os critérios de seleção, quando se atribuem casas sem cumprir as regras definidas, e quando não há planeamento suficiente, o que está em risco não é apenas o sucesso de um programa, é a confiança da população, a equidade no acesso à habitação e até a credibilidade da Região perante a União Europeia.

É urgente corrigir estes desvios, avaliar com seriedade os erros cometidos e garantir que os apoios chegam a quem realmente precisa, respeitando a legislação e os princípios da justiça social. Só assim se constrói uma política de habitação digna, credível e sustentável.

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