Por Baltazar das Bananas Camacho do Golfe – Edição Especial
N a Madeira, o paraíso turístico onde as flores desabrocham, as rotundas se multiplicam e o poder não muda de mãos desde que o fax foi inventado, Miguel Albuquerque decidiu apostar naquilo que mais o inspira: o luxo, o verde e o som do “ploc” da bola a cair no buraco. Nasce assim o novo projeto visionário do “Rei da República das Bananas”: transformar a ilha num imenso campo de golfe com vista para o Atlântico, e para o próprio ego.
Depois de investir em criptomoedas (e de ver a sua fortuna dar mais voltas do que um drone sobre a Ponta de São Lourenço), o Presidente do Governo Regional decidiu diversificar: agora quer investir na Madeira. Não nos hospitais, nos transportes ou na habitação — que ideia absurda! — mas sim em campos de golfe. Muitos. Tantos que até já se fala na criação de uma ilha artificial dedicada exclusivamente ao golfe. Um Dubai de bananas, um Las Vegas de erva, uma utopia neoliberal que faria chorar Adam Smith e rir Milton Friedman.
É claro que, para tudo isto brilhar, alguém tem de trabalhar. E quem melhor do que o madeirense médio — esse atleta do servilismo, treinado há séculos para carregar bandejas, malas e agora tacos?
Desde o Palácio de Reid, em 1891, que a elite estrangeira encontrou aqui o seu paraíso de descanso. O que Albuquerque faz agora é apenas atualizar o pacote: em vez de aristocratas ingleses, multimilionários digitais. Em vez de chá das cinco, gin tonic ao pôr-do-sol. O resultado é o mesmo, os locais continuam no mesmo papel: figurantes da sua própria terra.
A ilha tornou-se um case study digno de Harvard: um regime que realiza eleições, mas onde a alternância é tão provável como nevar no Funchal em Agosto. Os cientistas chamam a isto democracia iliberal; os madeirenses chamam “o normal”.
Aqui, o poder é hereditário por via partidária, e a lealdade política é a nova forma de cidadania. A separação de poderes? Apenas se for entre fairways e bunkers. O debate político, por sua vez, limita-se à eterna questão: “Prefere 18 buracos ou 36?”
O golfe, nesta “República das Bananas”, é mais do que um desporto é doutrina económica. Representa o sonho neoliberal de transformar cada metro quadrado em lucro, cada montanha num resort e cada cidadão num funcionário do turismo.
Entretanto, a retórica oficial promete desenvolvimento e emprego, omitindo o pormenor de que ambos já vêm com farda, crachá e turno rotativo. O Estado social dá lugar ao caddie social: todos com igual oportunidade de carregar o taco do patrão.
Os críticos são, previsivelmente, tratados como “malandros”, “vagabundos”, “ingratos”. É o léxico preferido de quem confunde oposição com ingratidão e crítica com insolência. Mas a ironia maior é esta: o discurso da humildade é proferido por quem vive rodeado de luxos pagos com fundos públicos e selfies de inauguração.
A democracia madeirense é como o campo de golfe que a simboliza: relvado, bonito, mas com o buraco sempre no mesmo sítio, no meio do povo.
“Questionário Cívico – Edição Golfe & Bananas”
- O povo madeirense é cidadão ou caddie de luxo?
- A Madeira é uma democracia tropical ou um condomínio fechado do PPD/PSD?
- Se a ilha é de todos, porque é que só alguns é que mandam — e sempre os mesmos?
- Quando Albuquerque fala em “futuro sustentável”, refere-se à economia, à natureza ou à sua própria carreira?
- Se não concordas, prepara o passaporte: há sempre um voo low-cost para sair da ilha.
A história repete-se: primeiro vieram os reis, depois os ingleses, agora os investidores de criptomoedas com swing de milionário. A diferença é que, desta vez, o campo é nosso, mas o jogo, como sempre, é deles.
A moral é simples: na “República das Bananas”, a esperança é verde… mas apenas no tapete de relva.
Enquanto uns jogam golfe e outros aplaudem, a democracia madeirense continua a tropeçar no buraco nove: o da consciência colectiva. Porque, convenhamos, quem controla o campo, escolhe as regras — e marca o tee time do povo.
