O madeirense precisa de reaprender a ler e escrever.



A propaganda e a massificação das perceções "cegam" o madeirense.

A ciência cognitiva e a neurociência têm apresentado fortes evidências de que a falta do hábito de leitura aprofundada (em formato longo, como livros) e a substituição da escrita à mão pela digitação têm implicações negativas no desenvolvimento e na manutenção das funções cognitivas. Mais cedo ou mais tarde virão as doenças por falta de "exercício". No entanto e no imediato, não se trata de um "declínio cognitivo" no sentido de uma doença, mas sim de uma redução na eficiência e profundidade de certas funções cerebrais essenciais.

As pessoas estão a ser facilmente enganadas pela propaganda, estamos no tempo da crise da leitura e a amnésia histórica na era digital

A diminuição dos hábitos de leitura aprofundada e o domínio da comunicação visual rápida nas redes sociais, como o Instagram, representam um desafio profundo para a consciência cívica e a compreensão da realidade, especialmente no contexto de uma Região com um legado histórico e político complexo. A consequência mais grave não é apenas o empobrecimento cultural individual, mas sim a criação de uma amnésia histórica que torna as comunidades vulneráveis à repetição de erros e ao consumo passivo de narrativas simplificadas, muitas vezes promovidas pela propaganda oficial.

Existe fuga do legado histórico, com a repetição e a desinformação.

O conhecimento da história regional e universal, social e política, aquilo a que chamamos legado histórico, é o maior antídoto contra a repetição de erros. Contudo, muitos não ligam nem sabem, convertidos aos tempos modernos que parecem saber tudo, mas caminhando para os mesmos erros.

A leitura de obras de história, ensaios políticos ou mesmo ficção de época, permite-nos contextualizar as decisões, analisar as consequências de certas políticas e identificar padrões de poder e abuso. Quando as pessoas deixam de ler criticamente, passam a confiar apenas na memória coletiva recente ou nas versões oficiais da história. Isto permite que os erros do passado (sejam eles de má gestão, autoritarismo ou clientelismo) sejam reembalados e vendidos como "novas soluções" ou "progresso", sem que as novas gerações tenham a capacidade de reconhecer o padrão.

Muitas vezes, a realidade social e económica da Região é mais dura, complexa ou multifacetada do que a imagem otimista e monolítica vendida pela propaganda. A leitura de documentos, reportagens aprofundadas e análises históricas oferece uma visão crítica que contrasta com a superfícial. Estar à margem do legado histórico é estar condenado a aceitar a versão que a propaganda vende no presente. A ausência de pensamento crítico, nutrido pela leitura, impede a comunidade de exigir mais ou de questionar a autenticidade do "sucesso" propagandeado. Temos, sem dúvida, um distanciamento da realidade regional, até porque o jornalismo local contribui para a estupidificação.

As redes sociais baseadas na imagem, como o Instagram, exacerbam este problema ao priorizarem o imediato e a superficialidade em detrimento da profundidade e da nuance.  O embrutecimento pela Imagem é uma realidade. O cérebro humano está a ser treinado para consumir informação em clips visuais rápidos, exigindo pouco esforço cognitivo. O Instagram reduz a comunicação a uma fotografia, um vídeo de 15 segundos ou, na melhor das hipóteses, a um carrossel de imagens.

Uma imagem de um novo projeto, uma inauguração ou um candidato num evento, frequentemente é veiculada sem uma única palavra de análise ou crítica, ou apenas com um título simplista e emocionalmente carregado ("Grande Obra!", "Progresso!", "O melhor para a Região!").

O algoritmo valoriza o visualmente apelativo e o que gera rápida interação, desfavorecendo o texto longo, o argumento complexo e a análise séria. Isto leva à ditadura da estética, onde a aparência (do político, do projeto, da Região) se torna mais importante do que a substância. 

A discussão política, social ou histórica exige nuance, a compreensão dos diferentes lados de uma questão. A imagem é inerentemente má a transmitir nuance; ela vende uma sensação, não uma verdade complexa. Este fenómeno contribui para a polarização, onde as pessoas só conseguem aceitar ideias que caibam numa story rápida e emocional. A capacidade de articular, debater e absorver argumentos longos, essenciais para a cidadania informada, é atrofiada.

Quando uma comunidade troca o livro de história pelo feed de imagens, sacrifica a sua memória crítica e a sua capacidade de discernimento. Sem a leitura, as pessoas perdem o "software" para processar a complexidade do mundo, tornando-se mais suscetíveis à propaganda que promete felicidade instantânea, ao mesmo tempo que as afasta da construção de uma realidade regional verdadeiramente informada e justa.

O resgate da consciência cívica e da capacidade de fiscalização na Região passa, urgentemente, pelo resgate do hábito de ler.

Nota: o homem que insiste nos tablets é candidato e vai lucrar com o embrutecimento?