No Funchal, a política está a ficar com um vício perigoso: uma coisa no plenário, outra coisa na fotografia. Vamos aos factos:
- Na Câmara Municipal do Funchal, quando a 7.ª alteração orçamental ligada ao eGames Lab/PRR apareceu para votação, os vereadores do CHEGA abstiveram-se. Está registado em ata: o ponto foi aprovado “por maioria”, com abstenção do JPP, PS e CHEGA.
- Na Assembleia Municipal, dias depois, o “grupo municipal” do CHEGA surge a votar favoravelmente, e a justificar o voto como necessário para “impedir a perda de fundos europeus”.
Então decidam-se:
ou havia dúvidas suficientes para abstenção… ou havia certezas suficientes para aprovar. As duas ao mesmo tempo não é “prudência”. É teatro. E quando a política entra em modo teatro, o povo tem o dever de perguntar: quem escreveu o guião? A pergunta que ninguém quer ouvir
Se na Câmara “não dava para votar a favor”, porquê que na Assembleia “já dava”? Quem falou com quem? O que foi explicado nos bastidores que não foi explicado aos munícipes? Porque isto não é “um detalhe técnico”. Isto é o núcleo da confiança pública: coerência.
E agora o “gato”: plataformas digitais, PRR e interesses
A história fica ainda mais malcheirosa quando se começa a falar das “plataformas digitais” e de quem anda à volta desse tipo de negócio.
Há quem diga, e isto exige esclarecimento público, não boatos, que estas plataformas podem ser um negócio orbitando interesses privados, com ligações pessoais e amizades conhecidas, nomeadamente envolvendo Jaime Filipe Ramos e a sua proximidade com Miguel Castro (se isto é falso, ótimo: esclareçam e acaba o assunto; se é verdadeiro, então a transparência tem de ser total).
E é aqui que entra o ponto central:
Quais são as empresas, os contratos, as adjudicações, os fornecedores, os intermediários e os beneficiários reais ligados a este “ecossistema digital” financiado por dinheiro europeu? Porque fundos europeus não são “dinheiro de ninguém”. São dinheiro de todos. E quando há confusão de votos e conversa de plataforma, o mínimo exigível é:
- publicação clara dos fornecedores e contratos;
- explicação do modelo de negócio;
- identificação de conflitos de interesse (se existirem);
- e coerência política: não se pode abster com ar de exigente e depois aprovar com ar de salvador.
Conclusão: coerência ou encenação?
O CHEGA tem de explicar aos funchalenses uma coisa muito simples: abstiveram-se porquê, e aprovaram porquê? Porque quando um partido muda de posição conforme o palco, e quando o assunto envolve PRR, plataformas e milhões, os cidadãos não são obrigados a engolir “narrativas”.
Os cidadãos olham e dizem, com toda a razão:
“Aqui há gato.”


