N o cerne do debate económico e social, a progressividade fiscal surge como um pilar fundamental para a construção de uma sociedade mais justa. Contrariamente às teses que defendem a taxa fixa, a ciência económica e a sociologia desmistificam conceitos e práticas que, à primeira vista, parecem lógicos, mas que, na realidade, perpetuam desigualdades.
A Ilusão da Taxa Fixa e a Realidade da Progressividade. A ideia de uma taxa fixa em impostos como o IVA, ou mesmo em taxas e multas, é, em essência, um retrocesso no que toca à justiça fiscal. Ao aplicar o mesmo esforço percentual a quem aufere rendimentos distintos, ignora-se a utilidade marginal do dinheiro. Ou seja, um euro representa um impacto muito maior na vida de quem tem menos do que na vida de quem tem mais. Assim, a taxa fixa, longe de ser equitativa, é, na prática, o oposto da progressividade, penalizando desproporcionalmente os que menos possuem.
O IRS e o IRC já são, por natureza, impostos progressivos, mas a sua aplicação, especialmente o IRS abusivamente elevado para escalões de rendimento baixos, revela uma distorção. Esta prática, em grande parte, serve para compensar a redução do IRC, que beneficia diretamente os grandes empresários, os verdadeiros detentores do poder económico. O rombo na receita fiscal, provocado por esta lógica, não é sequer compensado, resultando num investimento público insuficiente para manter e renovar o património e os serviços essenciais do Estado.
O Desafio da Fiscalização e a Fragilidade do "Mercado Livre". A alegação de que "mexer no IVA é dar dinheiro ao comerciante" é um reconhecimento, lamentável e negligente, da incapacidade e incompetência da fiscalização estatal. Esta postura revela uma aceitação tácita de que o Estado, desprovido de meios e vontade, se abstém de uma fiscalização eficaz. Aqui, o mito liberal da autorregulação do "mercado livre" desmorona-se, expondo uma falha sistémica: apregoa-se a fiscalização como complemento ao mercado, mas nem um nem outro demonstram funcionar adequadamente sem uma intervenção robusta e atenta do Estado.
A Desconstrução da "Classe Média": Um Conceito Divisor. A tão propalada "classe média" é, do ponto de vista da sociologia, um pseudo-conceito sem fundamento teórico ou prático. A sociologia, a ciência que estuda as classes sociais, aponta para a existência de duas classes distintas, nenhuma delas correspondendo à nebulosa "classe média". Este conceito serve, antes de mais, para dividir e fragmentar o povo, facilitando a dominação e o controlo social. Questionar a partir de que rendimento bruto mensal se é considerado "classe média" expõe a fragilidade e a arbitrariedade desta categorização.
O Estado como Agente de Devolução Social. É fundamental reverter a narrativa de que o Estado "subtrai a quem trabalha". Na verdade, a exploração advém daqueles que se apropriam da riqueza e do trabalho que a produz. O Estado, através da carga fiscal, devolve à sociedade os seus recursos em forma de salários, pensões, serviços públicos essenciais (educação, segurança social, justiça, saúde) e investimento público. Aqueles que exploram a riqueza alheia, em contraste, oferecem apenas "migalhas de pseudo-mecenas" ou "filantropos", um eufemismo para a benevolência de quem lucra com a exploração.
A afirmação de que "criar serviços de fiscalização custa muito dinheiro e não existe orçamento para tal" carece de fundamentação e revela uma falta de vontade política. Desmistificar estas falácias exige tempo, formação e um compromisso com a verdade, numa sociedade onde a disseminação de inverdades é, infelizmente, mais fácil do que a sua refutação.
A justiça fiscal, materializada na progressividade, é o caminho para uma sociedade mais equitativa. A desconstrução de mitos económicos e sociais, como a falácia da taxa fixa e a inexistência da "classe média", é crucial para um debate informado e para a construção de um futuro mais justo para todos.
Considera que a progressividade fiscal, aplicada a todos os impostos e taxas, é a chave para uma verdadeira justiça social?
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